quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Curiosidade

RELAÇÃO DAS FAMÍLIAS DE TAVAREDE E SEUS DESCENDENTES QUE CONHECI
DESDE 1915 A 1935.

Por Virgílio Silva Ramos

Com início na Casa do Paço (antiga habitação dos ex-Condes de Tavarede). seguindo pela ala direita da rua principal até á igreja da freguesia

- Casa do Paço -

Marido e Esposa Filhos

João Rosa - srª. D. Aninhas - Maximiano
António d’Oliveira (viúvo) - João, Etelvina e António
José Mª. Almeida Cruz - srª. Guilhermina - Augusto e António (Almeida Cruz
cantor)
José Maria Cordeiro - srª. Anita - José, Laurinda, João, Mário,
António e Marquinhas
Silvestre - esposa (?) - Palmirinha
Arménio Santos - srª. Palmirinha - Mènito
António Mota - srª. Mª. Joaquina - (sem descendentes)
José Mª. Marques - srª. Preciosa - Elisa e Augusta
José Cordeiro(3º) - srª. Otília - Maria Otília
Francisco Proa - srª. Amélia - Guilhermina, Manuel, João, Maria
e Etelvina
David d’Almeida - Marquinhas - José, Idalina, Rosa e David
Maria Mota (viúva) - Emília e António
Manuel Monteiro - srª. Anita - Lídia
José Medina - srª. Helena - Otília
António Cascão - srª. Aurélia - César, Emília e Maria Jesus
Francisco Cordeiro - srª. Marquitas - Guilhermina, Emília e Rosa
João d’Oliveira - srª. Guilhermina - António, Manuel, Clarisse, Maria
Virgínea e João
João dos Santos - srª. Marquinhas - João, Arménio e Felismina
Gentil Ribeiro - srª. Emília - José, Felismina, Fernando,
Virgínia, Marquinhas, Guilhermi-
na e Gentil
João Torto - srª. Emília Alhadas - António e João
Padre Vicente - e criada - (sem descendência)
José Madurinho - srª. Mabília - Saúl
Joaquim Marques - srª. Rosa - Enedina, Helder e Benilde
Isequiel Mota - srª. Maria - Carmina, Eduardo, Joaquim, Au-
gusto, José, Albino e Idalina
Joaquim Noca - srª. Mariana - António, Maria, João, Virginia e
Emília
Maria Adelaide (viúva) - João
César Cascão - srª. Ascenção - Aurélia e João
António ... - ti Rosita - (sem descendência)
Joaquim Grilo - srª. Hermínia - Elísio, José, Maria e Adelina
Joaquim Melaço - srª. Maria Grila - Cacilda, Florinda, José, Guilher-
mina, Laura e Maria
João Salgado - srª. Emília - Augusta, António, João e Rosa ?
Manuel Botija - srª. Maria - Francisco, António e Adelino
José Ramos - Srª. Filomena - Virgílio, Maria, Aida,Emília e Rosa
Manuel da Calçada - srª. Mª. José - (sem descendência)
Florinda (viúva) - Luciana
António Gato - srª. Luz Soares - Luiz
João Noca - srª. Marquitas - Evangelina, Constanto e Bacelisa

Segue a rua Principal da igraja até ao Paço

António Melaço - srª. Etelvina (o bruto) - (sem geração)
Joaquim Toquim - srª. Ricardina - Manuel, António, José, João e
Joaquim
Manuel Escaldado - srª. Polónia - Ricardo e Viriato
António da Chã - srª. Emília - (sem descendência)
Tenente Almeida - srª. Beatriz - Alda, Lucília e Albertina
António Cachulo - srª. Clementina - Maria, Augusta, Idalina e César
José Melaço - srª. Beatriz - António e Clementina
António Melaço - srª. Maria José - José, Jesus, Emília e Júlia
Aníbal Prôa - srª. Mª. Jesus - Isolino e Ricardo
António Carvalho - srª. Etelvina(Lameira) - (sem geração)
Martinho - srª. Sofia - Hermínia, Leonilde, Augusta, Mar-
quinhas, Aires e Guilhermina
António Salgado - srª. Augusta - Laura, Sofia e Isabel
José da Silva Cordeiro - srª. Rosa - José, Raúl e Emília
Faustino Ferreita - srª. Emília - Renato
António Medina Júnior - srª. Emília - António e Almira
Manuel Maltez-(viúvo) srª. Feliciana - António, Piedade, José Maria,
Carmina, Emília e José
José Mª. Terreiro - srª. Amélia - Amélia e José Maria
José Jorge - srª. Maraia Cruz - Manuel J.Cruz (da Voz da Justiça)
António Silva - srª. Augusta - Adriano e José
António Medina - srª. Otília - António, José, Violinda, Pedro e
Ricardo
José Cipriano e filho Assalino - srª. Maria - Ermelinda, António, Francisco,
Alberto, José e Máximo
Mário Cordeiro . srª. Rosa - António e José
Cascôas (velhas) solteiras - (sem descendentes)
João Cordeiro - srª. Maria - José, Joaquim,Arménio e António
Guilhermina Fadigas (viúva) - Emília
Marcelino - srª. Emília - (sem descendentes)
Rosa Pais (viúva) - ( “ “ )
Manuel Cascato - srª. Eugénia - Ilda, João, José e Celeste

Segue a Rua dos quatro caminhos (Senhor d’Arieira)

José Mª. Fresco - srª Maria Luísa - Maria, Camila, Celestino e José

Segue a Rua da Fonte até à Várzea

António Menano - Srª. Marquinhas - Almerinda, Emília e Alice
José Medina - srª. Maria - Jorge, João, Joaquim, Gracinda
e Manuel
António Matias - srª. Maria - Manuel, José, António e Joaquim
ti Roque - srª. Rosa Clara - Belmira
Antónia Carriça (sòzinha) - (sem descendentes)
Francisco Loureiro - srª. Emília - ?
José Cavaleiro - srª. Maria - Maria e Constantino
Manuel Loureiro - srª. Maria - Francisco, Maria, José, Manuel,
Rosa, Beatriz, Laura, etc.

Seguem as ruas interiores e Stº. Aleixo

José Mª. Maltez - srª. Ascenção - (sem descendentes)
António Maltez - srª. Rosa Maganôa - António, Virgínia e João
Joaquim Lopes - srª. Augusta (tarouco) - Joaquim, Domingos, Maria, Antó-
nio, Maximiano, Francelina, Ma-
nuel e João
Jaime Broeiro - srª. Ana Rôla - António Joaquim e Celeste
Manuel Leonor - srª. Maria - Joaquim,Celestino,Amélia e Maria
Samuel - Delfina Rôla - Ana
Francisco Carvalho - srª. Maria - José, Joaquina, etc.
Fernando Ribeiro - srª. Maria - Fernanda e Aurélia
Manuel Fernandes - srª. Mª. Augusta - Idalina, Alice, César,Emília e José
António Noca - srª. Constância - Maximiana, João, Emília, Alzira,
Carolina e Constância
Joaquim José - srª. Joaquina - João, Anita, Rosalina, Guilher-
mina, António e Adelaide
Mateus Cordeiro - srª. Joaquina - Isabel, José e João
Benjamim Monteiro - srª. Isabel - Silvino, Jorge, Alice, Arménio e
Canuto (faltou Rui)
António Grilo - srª. Anita - José, João, Emília e Efigénia
Manuel M. Fadigas - srª. Eduarda - (...)
Manuel das Botas - srª. Emília - Luz, João, José e Olímpia
José Lindote - srª. Mª. Miúda - Maria e Manuel Lindote
António Fadigas - srª. Glória - António (sargento) faleceu no
Ultramar. (José. António era o
mais novo. Falta Inédine)

Manuel da Chã - srª. Joaquina - Leopoldina, Belmira e António
José Moço - srª. Angélica Palaia - Evangelina e Adelaide
João Russo - srª. Maria - António, Marquinhas, Emília e
José
Manuel Sêco - ti Justina Grila - Maria, Beatriz, Augusta, Laura e
Emília
João P. da Silva - srª. Catarina - José, Caetano, Elísio, Ana, Fi-
lomena e Maria(do 2º matrimónio)
José G. d’Apolónia - srª. Idalina
António Amaral - srª. Piedade - Benjamim, Manuel (Balé) e Vita-
lina (Falta Maria)
José Vigário - ti Marquitas Pires - (sem descendentes)
António Jerónimo - srª. Laura - Mário António e Firmino António
(é Fermim)

-Estas 5 famílias ficaram fora da ordem por habitação-

Josefina Nunes (viúva) - Ricardo e Rosa
José Noca - srª. Maria Ribeiro - Letícia
João da Simôa - srª. Clementina - António e Emília
António Jorge - srª. Estrêla - Clementina
Domingos Lopes - srª. Belmira - (sem descendentes)

Segue a Rua do Outeiro

António Carvalho - srª. Mª. Cascôa - Francisco,Joaquina e Marquinhas
Francisco Pila - srª. Joaquina - José, Celeste (falta António e Júlio-
Henrique Broeiro - srª. Emília - Jaime, António, Manuel e José
António Marques - srª. Júlia - Augusto, Joaquim e Júlia
Manuel Tá-Mau - srª. Maria - Helena, Joaquim e João (Adelino)
José Cordeiro Neto - srª. Mª. José - Helena Maria
Manuel Batª. Ferreira - srª. Emília - Mário, Carlos, Alexandre, Manuel,
José e António
Elídio - srª. Maria Faim - (sem descendentes)

Segue o caminho dos Canos

José d’Almeida Ramos - Clarisse - Anabela
José Serra (da Rita) - srª. Maria - Marquinhas, Eduarda, José e
Fernando
João do Ricardo - srª. Maria - António, Emília e Rosa
António Maria - srª. Joaquina - Abel, Júlio, Adelina e Adriano
Domingos Tavares - srª. Maria - José António, Belmiro e Maria
Emília
Emília Monteiro (viúva) - Carlos e Benjamim

Segue o caminho do cemitério até ao Saltadouro

José Toquim - srª. Maria - Manuel, Emília, António, Marqui-
nhas, Urbano, Eugénia e Adelino
João Gaspar de Lemos (viúvo) - Ricardina e Cândida
Joaquim Madrugada (viúvo) - António, Carolina, Rosa, Manuel
e Francisco
António Catalão (viúvo) - Marta
Manuel M. Fadigas - ti Maria - João, Joaquim, Maria e Manuel
António Ferreira - srª. Margarida - Quitas, Emília, Beatriz, Joaquim,
José, Carlos e Faustino (o lº.)
Manuel Ladeira (viúvo) - António e Maria
Joquim Médoinho - srª. Maria - José, Maria e Aurora
António Faim - srª. Delfina - Manuel, Josefina e Maria
Manuel Rocha - srª. Adelaide - José (o Prosa)
José Larpão - srª. Augusta - Manuel e José
António Peidito - srª. Maria - Augusto e António
José Figueiredo - srª. Piedade - Manuel e Augusto
Manuel Geada - srª. Joaquina - Belmira, Maria e João
João Quilheiro - srª. Maria - António, José e Augusta
Joaquim Viúvo - srª. Rosa - Manuel e Marta
José Figueiredo - srª. Maria - César, Antº. Augusto e João

Foi escrito em 1988, por Virgílio Ramos

NOTA: Por lapso não foram registadas na devida altura as seguintes famílias:

António Lopes - srª. Emília - António (Engenheiro)
António Prôa - srª. Emília - Francisco, João, Aníbal e Cle-
mentina
António Jorge - srª. Estrela - Clementina
Pedro Medina - srª. Maria - Vitor e Violinda
António Tavares - srª. Emília - (?) (Ermelinda, António e José)
José Grilo - srª. Josefa - (?) (António, Emília e João)
João Gaspar - srª. Emília - (?) (João Pedro)
Manuel Tondela - srª. Joana - José, Maria José e Eugénia
Fradique (viúvo) - Rosa e Virgínia
José da Simôa - sacristão (viúvo) - Joaquim, João e Emília

Nota - Esta relação foi feita pelo saudoso tavaredense Virgílio Ramos, muitos anos depois da sua deslocação para Coimbra. Foi feito de memória, disse ele. Tem algumas falhas. Seria interessante actualizar esta listagem, mas não tenho elementos para tal, o que certamente iria originar imensas falhas. Assim, publico esta relação para que se houver alguns conterrâneos que disponham de elementos, tanto para a correcção como para a actualização, muito agradeço.

Sociedade de Instrução Tavaredense - 76


“Considerada por muitos como a catedral do teatro amador do nosso concelho, a Sociedade de Instrução Tavaredense está a comemorar noventa anos de existência brilhante, sendo unanimemente realçada a sua acção dentro do movimento associativo, a influência pedagógica que, ao longo dos anos, tem positivamente exercido dentro da sua comunidade e, a sua faceta culturalmente mais válida, o trabalho que desde sempre desenvolveu em prol do Teatro.

E hoje a SIT, neste seu ciclo “post José Ribeiro”, soube continuar a lição do Mestre, para nos voltar a surgir com uma pujança e validade que certos “velhos do Restelo” talvez ousassem arquivar na descrença. Bastaria atentar no programa comemorativo deste aniversário para se ter a certeza de que o concelho da Figueira pode continuar a orgulhar-se desta colectividade, que, numa renovada leitura e interpretação dos desejos dos tavaredenses, não busca apenas no Teatro corresponder às solicitações dos seus associados.


‘Omara’ 1994

Amanhã, vai assinalar-se a Grande Noite do Teatro, com a estreia da peça de Sigfredo Gordon “Omara”, numa tradução de José Ribeiro. Em “Omara”, peça de premente realismo, o autor oferece-nos o drama de uma mãe que ama o seu filho com tão excessivo e doentio ardor, que não se resigna a perdê-lo quando descobre que ele tem uma noiva”, escreveu ‘O Figueirense’.

‘Há trinta anos vivia eu a cerca de seis léguas da Figueira, mas chegavam ali ecos da actividade teatral em Tavarede… Amado, de nome, e amador de uns tantos ofícios em minha vida, houve uma altura em que me deu, também, para ensaiar uns “teatros”. Preparação especifica não tinha, pelo que tive de estudar umas coisitas, aproximar-me de entendidos nestas áreas e… avançar!

Sei que um dos primeiros passos que dei foi na direcção da terra do limonete. E aí vinha eu, com os homens do clube lá da terra (os quais pouco mais tinham em seus horizontes que uns bailes de vez em quanto…), até à capital do Teatro, que era, na altura, muito justamente, e continua a ser hoje, a freguesia de Tavarede. Figura emblemática de todas estas andanças era a pessoa de José da Silva Ribeiro com quem tive o privilégio de contactar por diversas vezes; em algumas delas recebi preciosos ensinamentos e prestimosa colaboração na cedência de adereços e cenários diversos.

Os anos iam passando, a minha situação sócio-profissional haveria de ser também alterada, até que… não sei por que bula, vim a cair, de novo, por onde havia começado a minha vida prática – a Figueira da Foz. Uma vez aqui, e desde há uma dezena de anos, mais e mais venho admirando Tavarede, quero dizer, todo o interesse e carinho que as suas gentes vêm manifestando pela arte de Talma. Faleceu, entretanto, o grande mestre, mas a escola por ele criada continua, em ritmo apreciável e agora mais adulta, porque liberta, também, de um certo trauma de orfandade por que, naturalmente, passou.

A peça presentemente ali em cena não desmerece, em nada, quantas ali já tive oportunidade de presenciar. Da autoria de um notável escritor mexicano, numa tradução de José Ribeiro, o seu desempenho foi confiado a verdadeiros artistas na arte de pisar o palco. Curioso que nela figuram elementos que entraram na primeira representação, já lá vão 28 anos, ainda que, agora, vestindo outras peles (caso de João Medina, ora o dr. Ayala, e, na altura, o jardineiro Tobias).

‘Omara’ - 1965

Como figura central, desta vez, a drª Ilda Manuela Simões, com a gana que se lhe conhece, em substituição da imortal Violinda Medina. Arrogante e altiva no seu orgulho solitário, sempre disposta a enfrentar as lutas, “Omara” foi muito bem interpretada (?) por Ilda Manuela. Despeitada e roída de ciúmes, deixa-se, no entanto, vencer, no final, ao “entregar-se” no caso que a atormentava devido ao patológico e possessivo sentimento que nutria pelo filho, quando este pretendeu amar uma mulher, à qual “Omara” apenas vaticinava pureza, candura, virgindade… Teatro de primeira água, também desta vez, em Tavarede”, escreveu um admirador do nosso teatro num jornal da Figueira.

Sociedade de Instrução Tavaredense - 75

O aniversário de Janeiro de 1993 teve o ponto mais alto na sessão solene comemorativa, durante a qual foi prestada homenagem póstuma a dois destacados amadores do grupo cénico: Fernando Severino dos Reis e António Jorge da Silva, tendo sido descerrados os seus retratos pintados pelo artista António Azenha.
Fernando Reis (O Romeiro) e António Jorge da Silva (Telmo Pais) na peça ‘Frei Luís de Sousa’ - 1951

E no Dia Mundial do Teatro desse ano, o grupo cénico levou à cena a peça ‘Tá Mar’, de Alfredo Cortez, tendo aproveitado a oportunidade para também homenagear ‘duas dedicações vivas à causa do ‘nosso teatro’, Jorge Monteiro de Sousa (o homem que faz dos cenários o seu brincar) e João Medina, 45 anos a pisar aquelas tábuas carregadas de história, tradição e muitas glórias’.

Em 1993, e pela primeira vez, o grupo cénico tavaredense ultrapassou as fronteiras. Convidada pela Câmara Municipal, uma embaixada tavaredense deslocou-se a França, a Gradignan, cidade geminada com a Figueira da Foz. “… A presença de Tavarede e dos seus amadores aproximava-se não apenas do fim, mas igualmente do seu momento mais elevado: nessa noite houve Teatro, na fabulosa sala das Quatro Estações, uma maravilha da técnica na construção de teatros!

Dizem os entendidos que foi uma das mais conseguidas representações das várias já efectuadas da “Tá Mar”, pela SIT e que mereceu nos fartos aplausos dos assistentes no anfiteatro. Em nome da verdade se deve dizer que não eram muitos. Tavarede, nessa noite, teve sérios inimigos: a televisão final da Taça de França, com a equipa do português Artur Jorge; a impiedosa chuvada que durante horas se manteve; um jantar de portugueses da zona, que comemorava o 10 de Junho e ainda uma festa que a uma centena de metros Gradignan vivia. Mas Tavarede e os seus amadores cumpriram com toda a dignidade a missão que haviam aceitado.



João Medina a ser caracterizado por Mestre José Ribeiro















Jorge Monteiro de Sousa, moço do fidalgo, 'Auto da Barca do Inferno'


O nome da Figueira da Foz, os propósitos da geminação, a arte dos amadores – teatrais, musicais, gastronómicos,--- - que de Tavarede, da sua freguesia, levaram a Gradignan uma mensagem de amizade, --- tudo, tudo foi cumprido com a qualidade, dedicação, muito figueirentismo, espírito de sacrifício, por um punhado de gente que bem merece o prémio de Divulgação do Nome da Figueira da Foz. Parabéns, amadores de Tavarede…”.

‘Tá Mar’

‘… pensamos que foi deveras gratificante para todos e sobretudo para esta colectividade levar o bom nome da nossa terra para além fronteiras…’, escreve-se no relatório da Direcção desse ano.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

NATAL


A todos os meus Amigos Leitores, suas Famílias e para todos os Tavaredenses, em geral, e figueirenses, desejo que passem com a maior Paz e Tranquilidade a quadra Natalícia que nos está a chegar.

Igualmente aproveito para desejar um Novo Ano de 2011 bastante melhor do que este que está a terminar.

Saúde para todos e, aproveitando a oportunidade, agradeço o me terem acompanhado nestas minhas histórias sobre a minha Terra, Tavarede, terra do limonete, e, em especial, sobre a vida das nossas Colectividades e aqueles que, embora já tenham partido, nos deixaram o exemplo da sua vida dedicada à sua terra.

Boas Festas para todos.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Sociedade de Instrução Tavaredense - 74

O Teatro em Tavarede continuava. A nova encenadora, Ana Maria Caetano, pôs em cena, como se referiu, a peça musicada ‘Terra do Limonete’. Agradou bastante. Uma nota crítica refere “Peça escrita pelo saudoso mestre José da Silva Ribeiro, há trinta anos, o seu texto, que nos conta a história de Tavarede desde o século XVI, numa harmoniosa sequência de quadros de fantasia com outros de tradição e pitoresco local, ainda hoje se mantém perfeitamente actual. Assistimos a um dos últimos espectáculos e ficámos agradavelmente surpreendidos com a representação onde a par de antigos e consagrados amadores, surgem muitos elementos novos com excelentes qualidades para fazer teatro. O público que enchia por completo a sala, não regateou fortes e merecidos aplausos ao grupo de Tavarede, ao qual também nós endereçamos os nossos parabéns”.

Integrada no programa comemorativo do 88º. aniversário, a Sociedade de Instrução Tavaredense levou a efeito um acto inédito: ‘a Estafeta do Teatro’. O trajecto escolhido, entre Coimbra (frente ao Teatro Académico de Gil Vicente) e a nossa sede, levou os participantes a cumprimentarem o Grupo de Teatro Amador de Taveiro, saudaram o CITEC, em Montemor-o-Velho, e evocaram, em Maiorca, o Actor Dias.

Para o espectáculo de gala foi ensaiada a peça de Molière ‘O Avarento’, que o grupo levou nesse ano às Jornadas de Teatro Amador, mas, devido a doença de um amador teatral, o espectáculo do aniversário teve de ser adiado, tendo sido convidado, para sua substituição, o Grupo Instrução e Recreio Quiaiense, que igualmente apresentou uma peça de Molière, ‘Médico à Força’.

‘O Avarento’

Foi com esta peça que comemorou o ‘Dia Mundial do Teatro’. E a propósito, aqui deixamos a transcrição da notícia que o jornal ‘O Figueirense’ publicou. “Tavarede, capital do nosso teatro amador concelhio, não poderia, como sucedeu em tantas localidades, deixar de assinalar o Dia Mundial do Teatro, que se comemorou no passado dia 27 de Março. É que se Tavarede tem tradições teatrais como ninguém, a verdade é que todo um Passado glorioso e um Presente não menos digno aumentou as responsabilidades da Sociedade de Instrução Tavaredense.

Assim o entenderam, e muito bem, os seus actuais dirigentes, fazendo subir ao palco, na passada sexta-feira, um senhor chamado Molière, um homem que a todos deu o privilégio da alegria, traduzida e provocada pela magia da arte teatral. E não resistimos a transcrever afirmações de Mestre José Ribeiro, em carta a um amigo, a respeito deste autor universal: “Pois o Molière é um bom amigo. A graça com que ele ri! A ironia com que ele critica! A profundidade do seu estudo da sociedade do seu tempo! Tenho rido com ele. E tenho pensado”.

E estamos certos que com Molière riram os muitos assistentes que na sede da SIT quase, quase enchiam o salão de espectáculos, numa noite em que o ingresso era livre, tal como o riso que os amadores de Tavarede souberam extrair de um texto, a que somaram a postura natural própria, ou só própria, daqueles que sentem Molière. Mas Molière não faz apenas rir (o que já era suficientemente saudável), mas também provoca a reflexão. A reflexão sobre acto de viver, nas suas mais contrastantes situações, o repensar de atitudes no diálogo quotidiano que o Homem trava com o Homem.

E “O Avarento”, peça em 5 actos, é (pode ser) o espelhar do que antes afirmámos, e embora ela decorra no século XVII, nem por isso o dia a dia… dos nossos dias evita o encontrar de posições similares. É tudo uma questão imaginativa. Antes da representação subiu ao palco o Dr. Pedrosa Russo, presidente do Lions, um clube de serviço que tanto tem feito, com as suas Jornadas de Teatro Amador, para o agarrar do Teatro. Com ele a Drª Ana Maria Caetano, ilustre e dedicada continuadora da linha teatral da SIT. Ambos falaram de Teatro, Teatro que é esperança, que é sonho, que é mentira, que é necessidade; Teatro que desperta a solidariedade, que confere dignidade e combate ao racismo. Teatro que também é um modo de estar na vida. Teatro de que Coimbra vai ser capital, mas que bom seria, foi afirmado, não esquecer o restante distrito, não esquecer, acrescentamos nós, Tavarede”.

Sociedade de Instrução Tavaredense - 73

Pelo aniversário de Janeiro de 1990, o grupo cénico fez a reposição de uma peça que, no ano de 1958, havia sido representada no Teatro da Trindade, em Lisboa, no Concurso de Teatro das Colectividades Amadoras, tendo conseguido honrosas classificações. Do programa das festas comemorativas dos 86 anos da SIT, fez parte a representação, no nosso palco, da peça ‘O crime da Aldeia Velha’, pelo Grupo Experimental de Mortágua, que agradou plenamente ao público tavaredense. Igualmente a nossa terra recebeu, uma vez mais, a Sociedade Filarmónica Gualdim Pais, de Tomar, que gentilmente acedeu ao convite que lhe foi endereçado.

Estas comemorações tiveram um especial carácter, pois o Rotary Clube da Figueira da Foz resolveu editar, em homenagem à memória de José da Silva Ribeiro, cuja capa insere um desenho de Zé Penicheiro. E no dia em que completaria 96 anos de idade, foi prestada mais uma homenagem ao saudoso Mestre de Teatro, com a inauguração do seu busto no largo fronteiro à sede da Sociedade de Instrução Tavaredense.


João de Oliveira Júnior

Mas o ano de 1990 ainda traria um enorme desgosto à nossa Colectividade e a Tavarede. Num acidente em Coimbra o nosso ensaiador, João de Oliveira Júnior, foi atropelado mortalmente. Foi mais um rude golpe para o grupo cénico. ‘Mas o Teatro não podia acabar em Tavarede. Ele já fazia parte dos tavaredenses’. Coube, então, à nossa conterrânea Ana Maria Caetano a responsabilidade do grupo cénico que ‘com muita coragem e determinação e demonstrando o seu grande amor ao Teatro e dedicação à SIT, assumiu o cargo’.

E foi com uma peça de Mestre José Ribeiro que iniciou a sua tarefa. Foi posta em cena ‘Terra do Limonete’, fantasia escrita e representada para a inauguração das obras feitas na nossa sede em 1965. Também esta peça foi representada nas Jornadas do Teatro Amador de 1991.

“Morreu João de Oliveira. O teatro do nosso concelho está de luto. A vida tem destas coisas. Ainda não se esgotaram os “ecos” da homenagem a esse outro grande Tavaredense e homem do teatro José da Silva Ribeiro e morre o seu continuador João de Oliveira. João de Oliveira morreu no passado dia 6 atropelado por uma ambulância quando passava numa passadeira na Av. Sá da Bandeira.
‘Terra do Limonete’

Que ironia do destino! João de Oliveira homem rigoroso no seu trabalho e na sua vida, morre atropelado numa passadeira e por uma ambulância... O teatro está mais pobre. A cultura figueirense que cada vez está mais abandonada e pobre, mais pobre e abandonada ficou com esta morte. Tavarede terra de teatro amador de grande qualidade e tradição perdeu mais um vulto que mantinha a tradição e a qualidade de um teatro que o público reconhecia e se reconhecia nas obras levadas à cena. A Sociedade de Instrução Tavaredense perdeu uma personalidade com que contava para manter a sua obra de cultura e do teatro. Oxalá os Tavaredenses consigam recuperar desta perda e manter o seu teatro, porque a Figueira precisa dele como do “pão (da cultura) para a boca”.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Luís João Rosa

“Faleceu em Tavarede, no último sábado, sepultando-se no domingo, o nosso amigo e dedicado correligionário sr. Luís João Rosa, proprietário da Quinta do Paço e ali, onde residia há anos, gozando da estima e consideração da população.

Deploramos a sua morte porque o tínhamos na conta de um dos nossos mais dedicados amigos e porque ali prestou serviços ao Partido Republicano Português, ainda ultimamente presidindo à Junta de Paróquia local.

O saudoso extinto, que era natural de Lavos, viveu em África alguns anos e, adquirindo alguns meios de fortuna, regressou aqui, comprando a quinta e a Casa do Paço de Tavarede, dedicando-se à lavoura e ao comércio de gados, tendo sempre um talho no nosso mercado. Era muito activo, mas a doença, que ultimamente o minava, prostrou-o no leito e em poucos dias lançou-o no tumulo”. (Outubro de 1916)

Luís João Rosa havia feito a compra do solar e quinta que pertenciam ao Conde de Tavarede, por escritura de 24 de Fevereiro de 1898, pelo valor de 5.000$000.

Pertenceu à Comissão de Beneficência da Freguesia de Tavarede, à Junta de Paróquia local, foi regedor e membro eleito para a 1ª. Comissão Paroquial Republicana, em 1911.

No campo associativo, pertenceu à Estudantina Tavaredense, a quem cedeu o Teatro Duque de Saldanha, instalado no solar que adquirira, e à Sociedade de Instrução, da qual fez parte como membro da Assembleia Geral.
Caderno: Tavaredenses com História

Ezequiel Leite Coelho Fortes

Era filho de António Leite Amaral Teles e de Joaquina Cândida Coelho Fortes. Residia em Tavarede, na sua quinta no caminho da Chã (Simôa), onde hoje está instalada a Junta de Freguesia e a Escola Primária, além de outras moradias.

Morreu a 17 de Janeiro de 1953, com a idade de 98 anos.

Não dispomos de outras informações sobre a sua vida. Recordamo-lo porque era costume, no dia de quinta-feira Santa, a rapaziada ir a sua casa pedir a “esmola”, sendo sempre contemplados com um bom punhado de avelãs, que tinha em abundância, de produção de diversas aveleiras existentes à beira do ribeiro que limitava a sua propriedade.
Caderno: Tavaredenses com História

António Pedrosa de Oliveira

Conhecido por António de Lavos, de onde era natural, e comerciante na Figueira, resolveu, em Abril de 1901, abrir em Tavarede um estabelecimento de mercearias e vinhos, ao Largo do Paço.

Aqui fixou residência até ao seu falecimento, que ocorreu em 21 de Fevereiro de 1912. Tinha 63 anos de idade.

Participou activamente na Junta de Paróquia, tendo sido nomeado regedor em 1904.

Um dia, estando doente, o seu amigo Ernesto Tomás foi visitá-lo. “… felizmente que o achámos melhor, bem capaz de lá para o S. João, mimosear os rapazes daqui, com umas danças e descantes dum rancho catita, que costuma organizar no seu quintal. A mulher, a Rosita que em tempos se dedicava ao palco, e que nos deu uns exemplares traquinas, folgazões, cheios da vivacidade da idade dourada, parecia-nos a mesma, com o mesmo génio franco, risonho, endiabrado, somente modificado um pouco pela idade, que já se acompanha de uma filha, a Josefita, loura, brincalhona, viva como a mãe”. Esta Rosita chamava-se Rosa Pais Pedrosa, era natural de Tavarede e morreu em Abril de 1927, com 83 anos de idade.
Caderno: Tavaredenses com História

Adelino da Cruz Mariano

Tavaredense. Foi um dedicado associativista, exercendo cargos directivos na Sociedade de Instrução e no Grupo Musical. Na primeira, também foi professor da escola nocturna. Enveredou pela carreira militar, tendo falecido em Setúbal, onde residiu durante vários anos.



Deixou uma interessante história. Enquanto residente em Tavarede, o seu meio de transporte era a bicicleta. Quando, profissionalmente, se ausentou da nossa terra, deixou a sua bicicleta, devidamente arrumada, na loja da casa onde morava com sua mãe, na rua Direita, perto do Largo da Igreja.



Um dia, em Dezembro de 1955, já anoitecera havia muito, encontraram sua mãe a passear a bicicleta, à mão, na estrada da Chã. Estranhando o caso, alguém quis saber o que se passava e logo teve a resposta: O Adelino havia escrito à mãe a pedir para alguém dar ar à bicicleta, para as câmaras e pneus não ressequirem.



A boa senhora não quis incomodar ninguém e foi ela mesma passear a bicicleta para lhe dar ar…








Tavarede Futebol Clube – Guarda-redes (1946)

(Caderno: Tavaredenses com História)

Sociedade de Instrução Tavaredense - 72


Mas o grupo dramático da Sociedade de Instrução Tavaredense continuou na sua actividade, repondo, sob a direcção e encenação de João de Oliveira Júnior, alguns dos maiores êxitos já ali representados. ‘Alguém terá de morrer’, ‘Horizonte’, ‘Uma Noite de Teatro Português’, espectáculo composto por um trecho de Gil Vicente, ‘O Tio Simplício’, de Almeida Garrett e ‘O Dia seguinte’, de Luís Francisco Rebelo.

Outro enorme êxito foi levado à cena pelo aniversário de Janeiro de 1987. Tratou-se da reposição da famosa opereta-fantasia ‘O Sonho do Cavador’, talvez a peça que maior número de representações teve. E a sessão solene desse mesmo aniversário foi complementada com uma homenagem prestada à memória de José da Silva Ribeiro pelo Rotary Clube da Figueira da Foz. As comemorações também tiveram a apresentação de um ‘diaporama’, da autoria de António Tomás, preenchido com imagens de José Ribeiro na sua actividade teatral e uma actuação do Coral David de Sousa.

‘O Sonho do Cavador’ (Rosa, Manuel da Fonte e Ti João da Quinta)

Por ocasião da representação da peça ‘Horizonte’, em 1988, encontrámos em ‘O Dever’ uma notícia que não resistimos a transcrever. Ei-la: “ Para mim, ir a Tavarede é recordar idos tempos da década de 40 em que ali, dentro do perímetro da freguesia rural que já foi sede de concelho, situada bem nas abas desta buliçosa cidade da Figueira da Foz que, quatro décadas volvidas, perfurou por tudo quanto é sítio este remansoso ambiente. Iniciei todo um passado de doze frutuosos anos no ex-Colégio Liceu Figueirense, mais tarde transformado em Seminário Menor da Diocese de Coimbra...

Para mim, ir a Tavarede é lembrar essa figura ímpar de José Ribeiro, a quem tive a felicidade de conhecer, e evocar todo o apoio, a vários níveis, dele recebido quando, já homem feito, na década de 60, eu me viria a ocupar, também, na encenação de umas “pècitas” de que saliento “Casa de Pais” e “Luz de Fátima”... Para mim, ir a Tavarede é encontrar a amizade franca e permanente de alguns amigos de infância e de outros de mais recente data, colegas de profissão, alguns deles enfronhados, ao que vejo, de alma e coração, nas actividades e iniciativas culturais do bom povo da terra que os viu nascer e a que tanto se orgulham de pertencer...

Para mim, ir a Tavarede é... hoje, também e sobretudo, admirar o seu Teatro nas peças que com pendular regularidade ali vêm sendo postas em cena, com o carinho, o bairrismo e a competência em que a gente de Tavarede é exímia... De longe vem a tradição de fazer bom teatro em Tavarede e inúmeras foram as representações a que já assisti. Desta vez, se me descuidava, deixava, mesmo, de admirar todo o garbo e empenhamento que aquele núcleo de inimitáveis amadores, perdão... de artistas, colocou, mais uma vez, na encenação da bela peça rústica da autoria de Manuel Frederico Pressler, HORIZONTE, cuja primeira representação teve lugar no já recuado ano de 1945 e que, agora, foi a escolhida para as comemorações do 84º aniversário da Sociedade de Instrução Tavaredense, em Janeiro último.

‘Horizonte’

A acção decorre no Ribatejo e versa um tema do quotidiano de muitas famílias – o casamento da Rita, que acaba por ir com quem o seu coração muito bem escolhe e não com aquele que o pai queria que fosse -, tendo como personagens elementos das mais diversas ocupações. Licenciados e barbeiros, empregados de escritório, carpinteiros e electricistas, de tudo ali há sem quaisquer complexos ou discriminações e apenas com uma finalidade: “darem o melhor de si levando até ao público o BOM TEATRO num convívio de amizade e simpatia”...

Perdeu, caro leitor. Perdeu, se acaso não viu esta representação em Tavarede. Acredite que só terá a lucrar se se deslocar ali sempre que haja TEATRO. Ele é de... primeira água, creia! ... E deixa de passar essas tardes (ou noites) de insípida rotina em que costuma mergulhar. É uma boa OPÇÃO!

Sociedade de Instrução Tavaredense - 71

A idade e a doença de Mestre José Ribeiro impediram-no de continuar a sua tarefa de encenador. A direcção do grupo cénico passou para João de Oliveira Júnior, um dos mais antigos amadores tavaredenses que, com o apoio e indicações do Mestre, apresentou a conhecida peça ‘A Nossa Casa’, que já havia sido levada à cena no nosso palco em 1943. Foi com esta peça que participou nas IX Jornadas do Teatro Amador da Figueira da Foz.





‘A Nossa Casa’









Para as comemorações do aniversário da colectividade, em Janeiro de 1986, o grupo cénico ensaiou e repôs em cena a famosa peça de José Ribeiro ‘Chá de Limonete’, que havia sido representada em 1950. “Esgotando lotações, em sucessivos espectáculos, o público mostra que não está tão arredio do teatro como se diz e que de facto a fantasia musical concebida pelo talento genial de José Ribeiro sabe criar a comunicação ideal entre público e actores. De facto, quem já teve a oportunidade de assistir à representação de ‘Chá de Limonete’ só pode sentir-se orgulhoso por assistir a um bom momento de teatro de amadores e enriquecido por um bom espectáculo onde a cor e alegria são o complemento adequado de um texto escorreito e pedagogicamente pragmático”, escreveu o crítico do ‘Diário de Coimbra’.

E para as Jornadas do Teatro Amador de 1986, a Sociedade de Instrução Tavaredense recorreu, uma vez mais, a Molière, o grande clássico francês. Foi com a peça ‘As Artimanhas de Scapino’ que fez a sua participação. Mas este ano de 1986 foi bastante dramático para o nosso teatro. No dia 13 de Setembro desse ano faleceu Mestre José da Silva Ribeiro. Já em Maio e Agosto haviam falecido dois grandes amadores do grupo cénico: Fernando Severino dos Reis e António Jorge da Silva. “Foi ontem a sepultar, no Cemitério de Tavarede, José da Silva Ribeiro. Há já algum tempo de saúde muito abalada, José da Silva Ribeiro terminou os seus dias, quase da mesma maneira com que atravessou a vida: em pleno sofrimento.

Completaria em Novembro 93 anos de idade, este homem de regime de vida espartano mas de suculenta alimentação espiritual. A sua acção, e modo de ser, pertencerão para sempre à história de teatro em Tavarede, na Figueira da Foz e no Baixo Mondego, aliás como a sua vivência cívica. Agraciado com a Ordem da Liberdade, pelo ex-Presidente general Ramalho Eanes, José Ribeiro não foi apenas a figura emblemática e carismática da Sociedade de Instrução Tavaredense que amou, egoisticamente, como o já tinham feito os seus progenitores.


José Ribeiro Retrato de Zé Penicheiro e Ex-libris desenho de Moreira Júnior

Autodidacta, utilizou a sua pena na “Voz da Justiça” até que a mordaça da censura e da ignominia lhe determinaram a morte. Mesmo assim, José Ribeiro soube sempre distinguir os adversários dos inimigos e recusar as migalhas oferecidas pelos “amigos”, mesmo quando os proventos materiais roçavam o franciscanismo. À frente da Sociedade de Instrução Tavaredense fez escola. Sem ser este o local para a devida apreciação, mesmo assim diremos que soube interpretar (os seus amantíssimos clássicos) na pureza mais original. Ainda, recentemente, no I Encontro de Teatro da Figueira da Foz o seu nome foi apontado (e aprovado) para tutelar um centro de apoio aos agrupamentos teatrais. A sua saúde debilitada já não lhe permitiu compreender o alcance desta justa medida. Oxalá, que as autoridades incumbidas de materializar o projecto saibam, urgentemente, dar-lhe a concretização devida. Será, talvez, uma pequeníssima homenagem. Mas é, indubitavelmente, a que merece quem sempre lutou com independência e honra. Para a tumba vão muitos segredos da sua vida, mas para quem fica resta a certeza que o teatro amador português perdeu alguém que o serviu com amor, arte e desinteresse. E quase sempre tendo a angústia como companheira mais próxima”. Esta nota foi publicada no jornal ‘Diário de Coimbra’.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

MISSA DO GALO - NATAL


Foi extraordinario, muito grande, como nunca vimos, o numero de fieis que correram á nossa egreja para assistir á festividade que ali se fez na noite de 24 para 25, celebrando o nascimento do Menino-Deus.

Era meia noite quando, desvendado e throno do altar mór, disfructámos um espectaculo sublime: um pequenino presepio rodeado de dezenas de lumes que reluziam brilhantemente por entre aquelle bello quadro, que a todos os christãos inspira tanta fé e ardente commoção.

Echoou então por todo o templo a Gloria in excelsis Deo, e continuou em seguida a cantar se a missa, que findou ás 2 horas, sendo celebrante o revdº. vigario d’esta freguezia sr. Costa e Silva; serviram de acolytos os coadjuctores de Quiaios e das Alhadas.

Prégou o revdº. Pimenta, de Verride, versando o seu discurso sobre: o providencial nascimento do Redemptor, os feitos de Jesus e o martyrio a que foi condemnado, sofrendo sempre as mais crueis amarguras, sacrificado a isso pelas suas ideais alta e verdadeiramente sublimes.

A decoração dos altares mór e lateraes revelava bem o gosto artistico do sr. Bernardo da Cruz, que, em trabalhos d’aquelle genero, o tem já demonstrado, quer aqui, quer n’essa cidade. O effeito produzido pelo altar mór, visto a distancia, era deveras atrahente.

O côro estava bem organisado, tanto na parte insttrumental como vocal, e diga se a verdade (que não podemos occultar), se não fôra o estar n’uma festa d’aldeira, pelo que alguns musicos costumam desempenhar os seus papeis com bem pouco esmero, teria jus a ser geralmente apreciado.

Cremos bem que isto não deixa de lhes saltar aos olhos, como não deixa de saltar aos dos que assistem áquelles actos e tenham ouvido já, pelos mesmos musicos, córos e orchestras magnificas, merecedoras de incontestavel applauso.

Entendem-nos decerto.

O Menino foi beijado com fervor alvoroço, pois todos queriam ser os primeiros a depor-lhe o quente beijo d’amor.


(Gazeta da Figueira - 29.Dezembro.1900)

NATAL - PRESÉPIO

Houve tempos - e não vão elles muito longe! - em que aqui, n’esta minha terra querida, se representava o presépio na noite de Natal e n’outras da época que, de geração em geração, nos tem vindo a relembrar a Natividade de Christo. Era uma distracção simples, mas reunia ella muitas familias n’um convivio fraternal, alegre, que nos proporcionava umas horas de satisfação intima.

Ia-se ao presepio, revia-se a gente na garbosidade das moças tavaredenses, vestidas a capricho no traje de pastoras, e admiravamos-lhes tambem as habilidades scenicas, porque ellas quasi sempre debutavam n’estes espectaculos... E d’ali, os felizes da sorte, regressavam ao lar, e lá iam rodear a certã onde fervia o azeite com os tradicionaes filhós, ou onde o forno transbordava com dovces tortas!

Era assim que se passava por aqui esta feliz quadra do Natal. E hoje, se é certo que ao estomago dos afortunados não faltam as abundantes consoadas com que se celebra a data natalicia, há no entanto - triste é dizel-o - a falta de qualquer espectaculo que nos recreie o espirito e que venha quebrar um tanto a insipida monotonia d’estas longas noites de Dezembro.

.......................

(Gazeta da Figueira - 12.Dezembro.1903)

Belmira Pinto dos Santos (Belmirinha)

Modista, com atelier de costura na Figueira da Foz, foi grande colaboradora do grupo cénico da Sociedade de Instrução.

Várias peças representadas, como O Grão-Ducado de Tavarede “… merece também referência especial o guarda-roupa, que é variado, luxuoso e tem algumas fantasias de belíssimo efeito, pelo que foi muito elogiada a srª. Belmira Pinto dos Santos, que revelou muito bom gosto na sua confecção”.

Outras operetas e fantasias, e citamos, por exemplo, O Sonho do Cavador, A Cigarra e a Formiga, Justiça de Sua Majestade, Entre Giestas e O Grande Industrial, tiveram guarda-roupa de sua autoria, muito do qual ainda se conserva entre o vasto espólio da colectividade.

Em 1928 foi distinguida com o diploma de sócia honorária, como reconhecimento dos serviços prestados.
Caderno: Tavaredenses com História

António Medina


Natural de Verride, nasceu no dia 20 de Janeiro de 1872, filho de Joaquim Medina e de Maria da Cruz.

Foi serralheiro na Companhia do Gás e Águas, onde se empregou muito novo. Depois do falecimento de seu pai, mudou a residência para o então chamado Casal do Rato e, casando com uma tavaredense, Otília Nunes, fixou-se em Tavarede.
Grande adepto do associativismo, como forma de cultura popular, começou a participar no grupo cénico e na filarmónica Verridense.

Quando estabeleceu residência em Tavarede, logo ingressou nos grupos dramáticos das Associações Velha e Nova, que funcionavam na Casa do Terreiro e no Palácio do Conde de Tavarede. Representou com os amadores dos grupos de João José da Costa e João dos Santos, na Casa do Terreiro, e do dr. Manuel Gomes Cruz, na Estudantina Tavaredense, onde também se integrou na sua tuna.

Foi um dos subscritores da lista que deu origem, em Janeiro de 1904, à fundação da Sociedade de Instrução Tavaredense. Foi director e amador dramático desta colectividade até meados de 1911, tendo saído, juntamente com seu irmão José, para fundar, em Agosto daquele ano, o Grupo Musical e de Instrução Tavaredense.

Continuou a dedicar-se ao teatro e à música, na tuna tocava rabecão (violão baixo), mas foi como director que mais se destacou na vida desta associação.

Em 1931, devido às enormes dificuldades financeiras do Grupo Musical, que não conseguiram ultrapassar, esta colectividade teve de vender o edifício da sua sede e mudar-se para o palácio, à altura pertencente a Marcelino Duarte Pinto. Deu a sua colaboração à tuna do Grupo até à sua extinção no ano de 1938.

A partir de então abandonou, por completo, a sua actividade associativa. Além da sua profissão, também era um pequeno lavrador, possuindo e amanhando umas terras na Chã e na Matioa. O vinho que produzia, tinha muita fama e costumava vendê-lo ao copo, na sua adega, em cuja porta, na época própria, pendurava enorme ramada de loureiro.

Foi membro da 1ª. Comissão Paroquial Republicana, eleita em 1911. O Grupo Musical homenageou-o, em 1925, descerrando o seu retrato, o qual se encontra exposto no salão da colectividade.

Morreu no dia 8 de Maio de 1958, encontrando-se sepultado em Tavarede. “O extinto, que fixou residência em Tavarede, ainda muito novo e ali constituiu família, foi um honrado cidadão estimado por todos que com ele privaram mercê do seu excelente carácter, tendo sido um entusiasta amador do teatro e da música, pelo que fundou o Grupo Musical e de Instrução Tavaredense”.


Caderno: Tavaredenses com História

D. Maria Mendes Petite

Fidalga do século catorze, foi casada com Estêvão Coelho e mãe de Pêro Coelho, que foi um dos carrascos de D. Inês de Castro, ao qual o rei D. Pedro I mandou justiçar, arrancando-lhe o coração pelas costas.

“O convento das freiras Dominicas, fundado em 1345, à custa de D. Maria Mendes Petite, na própria casa da sua residência, e doado às Donas Pregaratas, da Ordem de S. Domingos de Santarém”.

Esta fidalga dotou o mencionado convento com diversas propriedades que possuía em Vila Nova de Gaia; umas casas e herdade em Leiria; um terço de outras herdades em Santarém; umas azenhas e marinhas de sal em Tavarede…”.

Não há qualquer indicação quanto à localização das azenhas e das marinhas doadas.
Caderno: Tavaredenses com História

Sociedade de Instrução Tavaredense - 70


Como era habitual Mestre José Ribeiro fazer a apresentação das peças que levava à cena, foi com estranheza que, em 1984, antes da representação não tenha havido tal apresentação. O Mestre desta vez, apesar de ainda conservar todo o seu vigor, como o demonstrou a discursar na sessão solene, resolveu fazer a apresentação de Gil Vicente com um prólogo e quatro partes que preparou para o efeito. E foi desta forma inovadora, que José da Silva Ribeiro, depois de uma carreira teatral de quase oitenta anos, fez a última apresentação de um espectáculo ao povo da sua terra. Este motivo, leva-nos a aqui inserir a notícia, sobre este caso, publicada em ‘A Voz da Figueira’.

“A velha, prestimosa e consagrada Sociedade de Instrução Tavaredense, fundada em 15 de Janeiro de 1904, ali à ilharga da nossa terra, comemorou o seu 80º aniversário. Como sempre de forma tão adequada como simpática. Mas neste caso de maneira excepcionalmente brilhante, por o número em que figurou a costumada apresentação de uma escolhida peça teatral ser este ano constituído pela exibição da peça inédita em 1 prólogo e 4 partes, intitulada “Na Feira de Gil Vicente”, adaptação de mestre José da Silva Ribeiro e de homenagem e evocação da obra genial do fundador do Teatro Português.


‘Na Feira de Gil Vicente’

Foi, pode dizer-se, o brilhante corolário de uma inigualável actividade cultural, através do teatro, da colectividade aniversariante e também de uma acção ímpar, sob diversos aspectos, dessa grande figura de tavaredense, teatrólogo e democrata que é José da Silva Ribeiro. Só o que este nosso ilustre conterrâneo tem dado a conhecer ao povo do concelho sobre figuras e episódios da história nacional e de maneira particular e a merecer menção de relevo e justíssimo louvor a respeito de Tavarede e da Figueira e sua evolução através dos tempos, desde os mais remotos até à actualidade, não pode de maneira alguma ser resumido nas colunas de qualquer periódico. Mas isso de forma nenhuma deve impedir-nos de aqui deixar registado um superficial esboço do que tem sido há dezasseis lustros a vida da colectividade aniversariante e há mais de 65 anos a extraordinária, persistente, benemérita e incomparável actuação dentro dela da personalidade de José da Silva Ribeiro, servindo-a com a mais inexcedível abnegação e verdadeiro espírito de sacrifício sob todos os aspectos que é possível, desde os cargos directivos aos de autor teatral e “alma mater” da sua famosa secção dramática. Cuja fama largamente ultrapassou os limites do distrito, espalhando-se por importantes cidades e terras do país que visitou por várias vezes e sempre deixando significativamente assinalados a sua intervenção e invulgar brilho e mérito desta.

Para comprovar o que bastará, com certeza, registar certos factos que julgamos bastante elucidativos. A começar pelo de, após a brilhante carreira, com as suas múltiplas representações, nos vários palcos em que foram exibidas, das famosas peças “O Sonho do Cavador” e a “Cigarra e a Formiga”, das quais José da Silva Ribeiro foi o grande impulsionador e a que deu a mais operosa, destacada, importante e útil colaboração literária e teatral e depois de todo o grande esforço da sua montagem e encenação, ele jamais ter abandonado essa fase criadora de brilhante autor dramático. E, em virtude disso, ter escrito e feito representar esse belo rosário de inesquecíveis produções teatrais que começam em 1950 com “Chá de Limonete” (3 actos e 24 quadros) e continuam com “Terra do Limonete”, em 1961, “Camões e os Lusíadas” (1972), “Mesa Redonda” (1975), “Ontem, Hoje e Amanhã” (1979), “Ecos da Terra do Limonete” (1981), “Viagem na Nossa Terra (“Da folha de uma figueira à folha de uma videira”) (1982) e este ano “Na Feira de Gil Vicente”.


José da Silva Ribeiro
Uma das últimas fotografias suas

Uma destacada obra cultural a que não podem deixar ainda de associar-se, porém, coisas tão significativas como: uma famosa “Campanha Vicentina”, que levou a obra genial ao povo das nossas aldeias concelhias; as notáveis “Comemorações do Centenário de Garrett”, representando “Frei Luis de Sousa”, para além do nosso concelho, em Coimbra, Leiria, Tomar, Pombal, Alcobaça, Sintra, Soure, Marinha Grande e Condeixa; as comemorações do “Centenário de Marcelino Mesquita”, com a representação de “Peraltas e Sécias”; do “Centenário da Morte de D. João da Câmara”, levando à cena a sua famosa peça “Os Velhos” e do “V Centenário da Morte do Infante D. Henrique”, com a representação de “O Beijo do Infante”, do mesmo autor da peça anterior.

Para não deixar de fazer ainda referência à preciosa intervenção de José da Silva Ribeiro e da Sociedade de Instrução Tavaredense, no “IV Centenário de Shakespeare”, no “V Centenário do Nascimento de Gil Vicente” e “IV Centenário da Publicação dos Lusíadas”, no qual foi levado à cena o “Auto de El-Rei Seleuco” e uma evocação escrita propositadamente para o efeito.

O que tudo torna sumamente merecedora deste postal de efusivos parabéns a colectividade aniversariante e José da Silva Ribeiro, digno de todos os louvores que seja possível endereçar-lhe nesta ocasião festiva e bem merece pelos seus mais de 65 anos consecutivos de serviços ao teatro e à cultura, com a isenção, talento, amor e inteligência que os tornam excepcionais, como ainda pelas qualidades morais e cívicas que lhes emprestam adequada moldura e dão ainda maior relevo e projecção”.

Sociedade de Instrução Tavaredense - 69

Ainda em 1982, foi representada a peça ‘O Fim do Caminho’. E para o aniversário a comemorar em Janeiro de 1983, foi posta em cena a revista fantasia ‘Manta de Retalhos’. Foi a última, de uma longa lista, que Mestre José Ribeiro escreveu contando ao povo da sua terra a história, os usos e os costumes dos nossos antepassados.







‘O Fim do Caminho’





‘Afinal a Organização das Jornadas Culturais de Teatro Amador, não teria por certo dificuldades em presenças de colectividades, se por ventura as mesmas quisessem apresentar uma peça que já tivesse sido vista e revista! E dizemos isto apenas por concordarmos em absoluto com comentários ouvidos e que praticamente transcrevemos. Mas, falando de outro assunto, assistimos ontem à representação da peça “O Fim do Caminho”, num original de Allan Langdon Martin e levada à cena pela Sociedade de Instrução Tavaredense. E então, partindo do princípio de que o Teatro é a imagem e não realidade, o Teatro não se faz com homens! Faz-se isso sim com personagens; e os personagens de Teatro ou são transfiguração da sua (Teatro) verdade ou então são bonecos sem significado. Essa transfiguração é orientada precisamente através da interpretação que o encenador (quem foi?) faz do texto e do estilo que vai seguir. E foi isso que aconteceu: Dentro do estilo realista o encenador não transformou a acção dramática numa cópia da realidade (e muito bem) aproximou-se o mais possível da realidade histórica referente à época em que a acção decorreu, muito bem acompanhado por um belo guarda-roupa. Quanto à distribuição, ele não nos pareceu de todo correcta, tão somente pelo facto de um interveniente nos parecer o que poderemos considerar de “monocordo” e o personagem de Jeremiah Wayne, sem qualquer descortesia para quem o interpretou, mesmo com o rigor da caracterização que tentaram dar-lhe, estaria talvez um pouco deslocado na idade. Salvo as espreitadelas pela cortina e aquelas falhas que todos nós sabemos existirem antes dos actores entrarem, a representação não nos merece grandes reparos, mas sim um bravo. Gostámos de assistir a um nivelamento mais ou menos correcto dos actores, mas é claro que João Medina, foi ele mesmo, quer no velho Dr., quer no Centro Dramático. A todos, gratos pela representação’. Retirámos esta nota do jornal figueirense ‘Mar Alto’, a propósito da participação do nosso grupo nas Jornadas de Teatro Amador de 1983.

O 80º. aniversário da Sociedade de Instrução Tavaredense foi festejado nos dias 14 e 15 de Janeiro de 1984. Mestre José Ribeiro ainda teve forças para montar um espectáculo extraordinário. Mais uma vez apresentou Gil Vicente. E fê-lo como só ele era capaz de o fazer. ‘Há muito que, em Tavarede, o Teatro anda associado a todas as manifestações das suas gentes. Não será exagerado afirmar-se, até, que a vida em Tavarede gira em torno do seu Teatro. E, se alguém tiver dúvidas a tal respeito, apenas terá de ali se deslocar numa dessas ocasiões para constatar.




‘Na Feira de Gil Vicente’
Auto da Barca do Inferno





Agora, na comemoração do 80º aniversário da Sociedade de Instrução Tavaredense, o fenómeno repetiu-se: o momento mais alto das comemorações teve lugar no seu magnífico teatro onde foi levada à cena a peça “Na Feira de Gil Vicente”, com adaptação desse “homem grande de Teatro” que é José Ribeiro. Gil Vicente foi, assim, o “convidado” de honra de Tavarede, Gil Vicente que poderemos quase considerar familiar ali (quem não se lembra da inesquecível “melhor Maria Parda” que foi, sem dúvida, a saudosa Violinda Medina?). Desta vez foram levadas à cena: “No Lar de Uma Família Judaica” (prólogo), “Auto da Barca do Inferno”, “O Pote da Mofina Mendes”, “Gil Vicente vem à Feira” e “Auto da Feira”. Mas não será ousado apresentar, em Tavarede, peças de tal nível cultural?

É certo que a pergunta teria perfeito cabimento em relação à maioria dos centros portugueses. Mas a Tavarede não. É que ali há como que uma “representação colectiva” em que os que não sobem ao palco “representam” na plateia. Poder-se-á afirmar (passe o plágio) que quem não representa já representou e é esse facto que cria o tal ambiente em que se “respira teatro” e torna quase familiar a presença dos grandes vultos da cultura teatral. O teatro passou a fazer parte da vida desta gente, razão pela qual Gil Vicente é compreendido.

E sobre o espectáculo? Julgamos ter dito o suficiente. Adiantaremos, no entanto, que vimos em palco quatro gerações. E que, se aquele Diabo (João de Oliveira) foi o melhor que já vimos, “o sapateiro” (José Luiz Nascimento) e “o parvo” (João Medina Júnior), foram apenas duas excepcionais actuações num conjunto que surpreendia pela segurança com que todos dominavam a complicada linguagem de Gil Vicente, um autor que efectivamente, não está ao alcance de muitos grupos. Que nos perdoe o leitor a escassez de nota de reportagem aqui contidas. Mas a verdade é que, para poder ter uma ideia exacta do que foi o espectáculo, só terá uma forma: deslocar-se lá na próxima representação (21 do corrente às 21,45) só assim poderá ficar com uma ideia de conjunto, desde a peça aos actores, da orquestra (dirigida por José Custódio Ramos) ao guarda-roupa (Anahory), dos cenários... a tudo. Vá, que não se arrepende”.


‘Na Feira de Gil Vicente’


Na sessão solene desse aniversário, foi orador oficial o Dr. José Manuel Leite, grande amigo da nossa Colectividade. Permitam-nos que aqui recordemos algumas das suas palavras a propósito do espectáculo da noite anterior. ‘… Venho-vos hoje falar de um génio! Esse génio era o dono da “Feira” que vimos ontem representar neste teatro – Gil Vicente – “Feira” essa que foi montada por esse outro homem genial que nos acostumou a pedir-lhe e a exigir-lhe cada vez mais. Um é Gil Vicente, o outro é José Ribeiro. Pouco me importa neste momento perder-me em considerações de juízo de valor entre os dois. O que me importa é dizer o que os dois fizeram, nas suas respectivas épocas, contextos sociais, políticos e económicos e as condições de trabalho de cada um. O que me interessa salientar nesta hora, é que sem o segundo – José Ribeiro – nós aqui em Tavarede não conhecíamos o primeiro – Gil Vicente.

O que tem que ser salientado é que Gil Vicente renascentista, acarinhado e protegido pela corte portuguesa nos alvores do Séc. XVI, chegou ontem (como já o havia feito em ocasiões anteriores) a este palco, e a estas gentes. E isto devemos a Mestre José Ribeiro. Bem haja!”. Mais adiante afirmou: “Não é do Mestre José Ribeiro que venho hoje aqui falar. É do outro génio, é do seu colega Mestre Gil. E se tenho o arrojo de o fazer, é para suprir a falta das suas tão belas introduções a que em anos passados nos habituou antes de levantar o pano. Penso ser importante que todos façamos um esforço de caminharmos para trás no tempo – só 500 anos! Vamos deixar por uns momentos as preocupações do custo de vida, a ameaça dos mísseis nucleares, da “cultura” televisiva dos folhetins brasileiros. Ainda que não saiamos do país, vamos até à corte de D. João III, no alvor do séc. XVI…”.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

José Maria Cordeiro (Zé Neto)

Nasceu no dia 20 de Fevereiro de 1910, filho de João Cordeiro e de Maria Joaquina Vaz. Era conhecido por José “Neto”, pois seu avô e um tio tinham o mesmo nome.
Casou com Maria José da Silva Figueiredo e teve uma filha, Helena Maria.
Muito culto, foi um grande coleccionador de “ex-libris”, deixando uma bem organizada colecção, e dedicou-se à história da sua terra, organizando vários cadernos com recortes de jornais, especialmente relacionados com o teatro da Sociedade de Instrução Tavaredense.
Adepto das práticas desportivas, foi um dos fundadores do Sportsinhos Futebol Clube, em 1926, de que foi dirigente e atleta, e no ano de 1940, do Atlético Clube Tavaredense, “que se propõe trabalhar no sentido de chamar ao desporto, alguns “terroristas” que ainda por aí existem, que vêem erradamente no desporto não o revigoramento da raça, mas, sim, o seu definhamento”.
Foi muito dedicado à Sociedade de Instrução, exercendo diversos cargos directivos e de responsável pela biblioteca, que dirigiu durante vários anos com a maior proficiência. A colectividade distinguiu-o com o diploma de sócio honorário, em 1979.
No grupo cénico, onde actuou, como amador dramático, de 1946, na peça Horizonte, até 1965, em Centenário de Gil Vicente, interpretou diversas personagens em peças levadas à cena. No entanto, a sua grande colaboração prestada ao teatro terá sido como ponto, tarefa que desempenhou enquanto teve saúde.
Foi correspondente de jornais figueirenses e, em 1957, escreveu versos para serem cantados com a música da marcha “Tavarede tão airosa”, de António de Oliveira Cordeiro, a que deu o título de “Marcha dos Pacatos”:

Tavarede, aldeia linda,

De perfume sem igual,
Filha da mais bela praia
Deste lindo Portugal.
Foi berço de fidalguia,
Deixou nome na história,
Hoje tem o seu teatro
P'ra lhe dar fama e glória.
Figueira, terra formosa,
Tens o condão de encantar
Quem lá vai a vez primeira,
Por força há-de voltar.
Pequenina, aconchegada,
Cada canto é um alegrete,
Para a cura das 'maleitas'
Tem o 'chá de limonete'.

Temos por nome “Os Pacatos”,
- Esse nome não negamos –
Mas se nos chega a “mostarda”
Com certeza espirramos.

Esta vida são dois dias,
Toca a rir, folgar, gozar…
E se dívidas cá deixarmos
Alguém as há-de pagar.

Sua esposa, Maria José (19.03.1910 – 22.04.1984), filha de Helena Figueiredo Medina, também foi uma excelente amadora teatral, Iniciou-se em 1925, na opereta Em busca da Lúcia-Lima e terminou, em 1929, em A Cigarra e a Formiga, participando em Pátria Livre, Grão-Ducado de Tavarede, O Sonho do Cavador, etc. Igualmente a Sociedade de Instrução lhe concedeu o diploma de sócia honorária, em 1928.


Caderno: Tavaredenses com História

João Jorge da Silva


Natural de Tavarede, onde nasceu no ano de 1882, era filho de José Jorge da Silva e de Ana Cunha. Era conhecido por João da Simôa, certamente porque terá nascido ou morado neste lugar, no caminho da Chã. Casou com Clementina Nunes Proa e tiveram dois filhos: António e Emília. Faleceu a 5 de Maio de 1952, com a idade de 70 anos.
Profissionalmente foi tipógrafo, exercendo funções de impressor na tipografia de “A Voz da Justiça”.
Aderiu, desde a sua fundação, ao Grupo Musical e de Instrução Tavaredense, onde, em 1912, foi professor de uma aula de música. Dirigia a orquestra dos teatros e foi o organizador e regente da primeira tuna desta associação, à frente da qual esteve cerca de seis anos. Foi nomeado sócio honorário desta colectividade em Dezembro de 1937.
Abandonou a actividade associativa, por volta de 1918. No entanto, em Abril de 1924, aparece uma notícia informando que “decorreu animadíssimo o baile realizado na Sociedade de Instrução Tavaredense no último sábado, por iniciativa do nosso amigo João Jorge da Silva. A concorrência foi grande, reinando a melhor alegria e prolongando-se a dança até alta madrugada de domingo”.
Sua esposa, Clementina, dedicou-se, durante muitos anos, à venda de tremoços, freiras e pevides, com “estabelecimento” no Largo do Paço, junto ao qual moravam.


Caderno: Tavaredenses com História

Francisco de Carvalho

Nasceu em Tavarede, filho de António Carvalho e de Joaquina da Silva Cascôa. Morreu, em Buarcos, no dia 11 de Fevereiro de 1980.
Prestou serviço militar no Regimento de Infantaria 28, sendo incorporado no Corpo Expedicionário que foi combater em França, na I Grande Guerra, donde regressou em Maio de 1919.
Durante cerca de 50 anos fez parte dos amadores da Sociedade de Instrução. Iniciou a sua colaboração em 1914, em Os Amores de Mariana, acabando na peça A Conspiradora. Representou papéis em peças como Amor de Perdição, Entre duas Ave-Marias, Noite de S. João, Em busca da Lúcia-Lima, Pátria Livre, Grão Ducado de Tavarede, O Sonho do Cavador, A Cigarra e a Formiga, Os Fidalgos da Casa Mourisca, Justiça de Sua Majestade, Entre Giestas, A Morgadinha de Valflor, Ana Maria, Peraltas e Sécias, A Conspiradora, etc.
Tinha uma excelente voz de barítono, refere uma crítica de A Cigarra e a Formiga. Em 1954, por ocasião da Bodas de Ouro da colectividade, reviveu o papel de Ti Martinho Grave, da peça Entre Giestas, que interpretara muitos anos antes.
Certamente por ter inalado gazes nocivos durante a campanha militar, sofreu graves perturbações psíquicas, o que forçou ao seu internamento num hospital para doentes mentais, durante bastante tempo.
Foi sócio honorário da SIT, em 1967.
Caderno: Tavaredenses com História

Sociedade de Instrução Tavaredense - 68

(continuação) … Pedis-te-me uma nota para o teu jornal que devia ser breve. E escrevi este artigo leguapoveiro, muito extenso e que diz pouco. Perdoa. E já agora, com um pouco mais de espaço talvez queiras aproveitar a página de memórias, - Memórias que não se escrevem – que aqui junto. Em Agosto de 81 tinha eu concluído a “Viagem na Nossa Terra” para ser representada pelo 78º aniversário da SIT, em Janeiro de 82. Seria a ocasião própria para o reaparecimento de Violinda Medina no palco de Tavarede. Escrevi para o efeito a cena 12ª – “Gente da Enxada”, dividida em duas partes:

1) Regresso ao Lar – Eram os cavadores de Tavarede (já muito poucos…) que apareciam ao fundo da plateia e, descendo pelo centro, subiam ao palco, enxada ao ombro, cantando
Lá vão!
Lá vão
Os ranchos do labor
… … … … … … …
e, apagando-se ao longe o coro das enxadas, seguia-se a 2ª parte. Transcrevo: 2) Génio Alegre – Surge à frente da cortina a figura do Génio Alegre:

Violinda – “Foram eles, os cavadores de Tavarede, que me chamaram aqui… As badaladas do sino e as vozes dos cavadores no seu hino do trabalho evocaram no meu espírito uma cena em que também se viam homens no trabalho da terra e se ouviam badaladas e repiques de sinos barulhentos. (Transição) Foi há muitos anos!... Que saudades! Eu não era então a velha que hoje aqui está convosco. Era ainda jovem, uma rapariga alegre, contente, risonha, cheia de saúde e chamava-me Consuelo!... Parecia trazer o sol na alma e nos olhos e no coração e na boca a graça das cantigas andaluzas. Foi em Alminar de la Reina: estava em casa de minha tia, a nobre senhora Dona Sacramento, Marquesa do los Arrayanes. Era um belo palácio antigo, donde parecia ter desertado a alegria, se alguma vez houve alegria dentro daquelas vetustas paredes. No pátio andaluz existia um gracioso tanque com repuxo, mas não corria água no repuxo nem havia flores no pátio; enchi o pátio com vasos de flores e fiz correr água no repuxo; e aquele palácio velho e triste parecia agora rejuvenescido e alegre. (Transição) Certo dia, eu e várias cachopas e rapazes tínhamos ido a um casamento de ciganos. Quando já voltávamos do casamento, a palrar e a rir, muitos alegres”……………………………





Génio Alegre - 1938
(António Broeiro e Violinda Medina
)



E vem então o belo monólogo dos sinos que a alegre e irrequieta Consuelo (a Violinda) dizia, cantava, vivia assombrosamente, com os olhos, a boca e a alma cheios de riso, de luz, de alegria transbordante. Tu, meu velho Medina, não viste, não podes fazer ideia, e eu não posso contar-te, descrever-te de maneira que tu entendas e sintas o que foi no Teatro do Casino Peninsular a estreia do “Génio Alegre” e a cena genial em que a Violina, com o João Cascão e o Manuel Nogueira, faziam renascer para a beleza e para a alegria o pátio sombrio da velha Marquesa de Arrayanes, fazendo correr a água no repuxo e enchendo o pátio de vasos floridos, numa cena rica de movimento, de alegria, de risos, de vida feliz. E a plateia, e o balcão, toda a gente de pé, batendo palmas, contentes, muitos rindo, alguns chorando – que também se chora de contentamento, de alegria.

Esta cena com o monólogo dos sinos seria a grande homenagem a Violinda Medina, genial intérprete da deliciosa comédia dos Quintero, ali no Teatro de Tavarede, com os seus companheiros e o povo da sua terra e os seus admiradores de todo o concelho da Figueira. Falei com a Violinda – escondi-lhe o propósito da homenagem -, li-lhe o papel e ela, mesmo sentindo o peso dos anos e as tristezas da sua vida sem ventura, como que se animou à ideia de dizer ainda uma vez o seu belo, luminoso, arrebatador monólogo dos sinos, cheio de sol, de alegria de viver, de risos e de sons que vinham no repique destrambelhado dos sinos barulhentos. Para dias depois ficara combinado um ensaio de recordação, que já se não fez: a Helena – relíquia também do Teatro de Tavarede – trouxe-me a desilusão – que a Violinda não tinha forças para transmitir ao papel o movimento e a graça, a luz e a alma daquela irrequieta Consuelo, cheia de saúde e rica de alegria…

E lá ficaram, agrafadas e sepultadas no caderno que servia ao ponto, as folhas 44, 45 e 46 com a cena irrepresentada do Génio Alegre que seria a Violinda. No verso da folha 43 da “Viagem na Nossa Terra” escrevi: “Com grande mágoa se exara aqui a nota que segue: Este quadro do Génio Alegre preparou-se para ser erguido no palco, na noite da estreia desta Viagem na Nossa Terra, no aniversário da SIT, em Janeiro de 1982. Seria então a grande homenagem à Violinda dos amadores da SIT e do público que tanto admira esta nossa querida amadora – a maior de quantas conheci, como ensaiador, do Teatro de Tavarede. Infelizmente, a doença não lhe permite pisar de novo o palco. Por isso, tive de substituir o quadro. Tavarede, 3-11-81. José da Silva Ribeiro”.

Bem sabemos que foi demasiada extensa esta cópia. Mas, parece-nos, era absolutamente indispensável na história da Sociedade de Instrução Tavaredense.

Sociedade de Instrução Tavaredense - 67






Sobre a fantasia anteriormente referida e que tanto êxito alcançou, vamos somente transcrever um pouco mais. “… Esta peça, a que chamamos “Fantasia Histórica”, é mais um original de Mestre José da Silva Ribeiro, que, com os seus oitenta e muitos anos, continua a transportar para o palco toda a juventude do seu enorme talento. Esta peça de teatro é mais um documento histórico da nossa terra, e Mestre José Ribeiro a escreveu em louvor do I Centenário da cidade da Figueira da Foz, pois que alguns quadros o expressam na sua maior clareza. Cavando mais um pouco da história longínqua da sua terra, que tanto ama, - Tavarede -, José Ribeiro não deixou de fazer a sua crítica a momentos actuais e de abraçar a Figueira da Foz neste momento alto da sua existência, que é a comemoração do I Centenário da elevação a cidade.

Pensamos, temos a certeza, de que este é, até ao momento, o mais alto contributo para as Comemorações. Julgamos mesmo, que seria imperioso a Comissão Executiva das Comemorações do Centenário, fazer todas as demarches para que esta relíquia e rica peça de teatro fizesse uma digressão por todas as freguesias, e povoações onde fosse possível, para que a população do nosso concelho aprendesse um pouco da história da nossa cidade. – De Afonso Henriques até aos nossos dias, à mistura com quadros de fantasia, é mostrada a história de um povo…”.

No dia 16 de Março de 1982, faleceu Violinda Medina e Silva, a grande amadora do nosso teatro amador. A pedido do Jornal de Sintra, Mestre José Ribeiro escreveu uma notícia sobre esta Mulher tavaredense. É uma carta enorme, que não permite aqui a sua total transcrição. Mas não podemos deixar de para aqui transportar alguns fragmentos da mesma: “ O corpo de tua irmã ainda estava ali na igreja no caixão em que ela quis levar algumas tábuas do palco que durante tantos anos pisara; o espírito da Violinda já tinha voado, mas eu sentia-o vivo, bem vivo no turbilhão das minhas saudades. E eis que vem o teu rapaz pedir-me uma nota sobre a Violinda para o teu jornal – uma breve nota sobre a admirável Mulher e grande e querida Artista de Tavarede – Violinda Medina e Silva.



Violinda Medina e Silva ‘Frei Luís de Sousa’ (desenho do professor Alberto de Lacerda)

Mas, meu velho e desventurado António Medina Júnior: eu já não sei escrever para jornais – nem para os meus, que já não tenho, pois ambos me roubaram e porque deste então senti que me tornavam analfabeto. Perdi-lhe o jeito. Pode o bilhete de identidade continuar a chamar-me jornalista: é mentira piedosa que fiquei devendo, por mal dos meus pecados, à validade perpétua que ali me está assegurada. Que escreva para o teu jornal uma nota sobre a Violinda, pedes-me. Pois, meu velho companheiro da velha escola da nossa querida e inesquecível D. Amália! Tu bem sabes, e bem sentes, que a minha vida, como a tua, é já uma longa caminhada tristemente florida de muitas cruzes. Para qualquer lado que me volte – são ecos de ásperas e dolorosas lutas, algumas alegrias e tristezas com sinais dos encontrões que aguentei sem que algum tivesse força bastante para me não deixar de pé. E, tu bem o sabes, está comigo, infatigavelmente permanece – o Teatro. E o Teatro de Tavarede sempre o vejo e sinto com a Violinda Medina – admirável Mulher que a paixão da filha única, brutalmente arrancada ao seu grande amor de Mãe, matou para toda a alegria, só lhe deixando alma para resignadamente desfiar o rosário das desventuras.

Quando em 1931 a Violinda veio para o grupo de amadores da SIT logo ela se me revelou de espantosa intuição. Possuía linda voz com volume e extensão e era boa e simpática figura. Aqui na SIT se lhe afervorou a outra grande paixão da sua vida – o Teatro. E no Teatro, que cultivou com inteligência e invulgar sentido de Arte e raro espírito de sacrifício – até de saúde e comodidades – foi grande e admirável Actriz em várias das muitas peças que representou… … A primeira peça que tive como intérprete Violinda Medina foi Os Fidalgos da Casa Mourisca. Passaram já 50 anos… A última foi O Processo de Jesus. Entre uma e outra, quanta alegria, quanta beleza, quanta riqueza e diversidade de sentimentos, quanta grandeza e miséria e lágrimas e risos – comédia e drama, farsa e tragédia moldadas em prosa e verso. Ela tornou vivos no palco de Tavarede, e em Coimbra, Tomar, Lisboa, Porto, Leiria, Pombal, Soure, Pampilhosa, Cantanhede, Condeixa, Marinha Grande, Sintra, Colares, Arazede, Torres Novas, Torres Vedras, Maceira Liz, Alfarelos, Entroncamento, Vila Nova de Ourém, Amarante, Vila Real, Aveiro, Abrunheira, Figueira da Foz e em quase todas as freguesias deste concelho. Ela, a inesquecível Violinda, foi a pura alegria e o riso álacre dos Quintero no Génio Alegre, a raiva e o amor de Clara de Entre Giestas, o destroçado coração (que já o tinha sido na vida verdadeira da intérprete!) daquela Velhinha do Processo de Jesus, que sentia vivo ainda o filho já morto e lhe falava e o ouvia; foi a graça manhosa da criada do Tartufo, e a brava Rita Firmino de Horizonte, e a doce Avó de As Árvores Morrem de Pé, em cuja cena da bebedeira ninguém a ultrapassou e a aristocrata corajosa e astuta que foi a Conspiradora; e foi o milagre de arte de representar com que transformou em verdadeira cena teatral o monólogo vicentino do Pranto de Maria Parda! E outras e outras figuras com que enriqueceu a galeria das suas criações.






Violinda Medina e Silva
O Pranto de Maria Parda










Logo no nosso primeiro encontro – íamos ler Os Fidalgos da Casa Mourisca – a Violinda se abriu em confissão: nunca tinha lido uma peça de teatro; sabia de cor algumas cenas do Presépio, tinha representado uma ou outra daquelas peças, comédia ou drama, que se vendiam impressas para amadores. Que não sabia nada de técnicas nem da história do Teatro: “Nunca me ensinaram…”. Ela, muito presa à sua vida de casa e nunca faltando a um ensaio (“nem que chova” e mesmo chovendo, a Violinda, o João Cascão e os Broeiros – todos excelentes, valiosos e briosos amadores! – nunca faltavam ao ensaio), a Violinda tomou gosto pela leitura de teatro. E leu teatro. Gostou muito de Marcelino Mesquita, e fez brilhantemente a protagonista do Envelhecer. Foi um atrevimento de que saiu vitoriosa. E estou a lembrar-me, meu caro António, de que tu viste aí em Sintra a tua irmã numa peça do Marcelino, não o Envelhecer mas Peraltas e Sécias. Foram duas representações inesquecíveis! Na primeira noite representou-se Frei Luís de Sousa. A Violinda foi grande, espantosa na Madalena de Vilhena. Abraçada à cruz, era a imagem viva da própria dor, a suprema angústia daquela mãe: “Tomai, Senhor, tomai tudo! Oh! A minha filha! Também essa vos dou, meu Deus!”. A Violinda subiu alto, foi sublime de beleza trágica na obra gloriosa de Garrett. Estou a escrever-te, vejo o “teu” teatro cheio, um silêncio pesado em que só lágrimas falavam, oiço essas lágrimas da Mãe preludiando a morte da Filha – e aqui me tens a senti-las, aquelas puríssimas lágrimas, esquecido da distanciação brechtiana… (continua)