sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

RECORDAÇÕES DE TAVAREDE

Descendo do Terreiro da casa de Ourão para o extremo do povoado, atravessam-se umas ruellas que, pela exiguidade da sua largura e extensão, não podem merecer o nome de - ruas.


De um e outro lado d’ellas vêem-se uns casebres acanhados, antiquissimos, baixos, quasi sem luz, não vestindo a camisa lavada do caio branco, alegre, que tanto distingue a apparencia da rua Direita. É um contraste. Parece que esta, como outras povoações, conserva ainda o timbre condemnavel de mostrar apparencias. É o que na linguagem pittoresca do povo se pode chamar: -um janota de casaca e... sem camisa.


Se isso coubesse dentro das considerações dos interesses particulares e d’aquelles que se teem de levar em conta relativamente ás forças dos cofres municipaes, a sciencia aconselharia a hygiene, a formosura, a saude dos povos, que, estas terras moldadas em um principio acanhado, se fossem pouco a pouco modificando: alargando-lhe as ruas, abrindo-lhe largos, arborisando-os convenientemente, alliando assim o util ao agradavel. N’este sentido muito poderiam fazer as camaras municipaes, bem fundadas em um decreto applicavel, que, se bem nos recorda, é de junho ou julho de 1864.


A parte a que nos temos referido da povoação, e se o cofre municipal estivesse em circumstancias de tal fazer, deveriam ellas ir, até á sua completa expropriação por utilidade publica. Valem - áquelle brio, as circumstancias naturaes de salubridade que disfructa, aliás, uma epidemia qualquer, teria ali pasto para cevar-se. Haja vista o que lá succedeu com a epidemia de bexigas, confluentes que se desenvolveu em 1871 a 72, em que a camara municipal teve de providenciar apertadamente sobre as indicações dos distinctos clinicos, dr. Antonio Lopes da Silva, já fallecido, e do sr. dr. Francisco Maria de Lima e Nunes, que felizmente ainda vive.


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Mas, reatando a nossa descripção e descendo do Terreiro em direcção á egreja, encontrámos perto d’esta a capella de Santo Aleixo, que se diz, ter pertencido ao cabido da Sé de Coimbra.


É pequeno o seu ambito pois que, apenas poderá ter uns dez metros de fundo, por quatro a cinco de frente. Restam d’ella as quatro paredes que formam o rectangulo em superficie, e tem ainda a porta de entrada sobrepujada por uma pequenissima janela; e lá dentro uma vegetação robusta e espessa de silvas, crescendo e elevando-se, acima da altura das paredes circumdantes ao recinto.


Sobre a empena de frente vegetam luxuriantes as heras, engrinaldando aquelle antigo templo christão podendo-se dizer, como um poeta:


“Como as heras que abraçam docemente,
“As ruinas d’um portico pagão.”


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N’esta capella eram feitos antes de 1875 os enterramentos dos fallecidos na freguezia, até que, depois de construido o novo cemiterio, na estrada que segue para Brenha, e para o lado nascente da egreja, lá se principiaram a fazer os enterramentos.


Passando e vendo que ella apenas se achava vedada por quatro taboas, e uma mais, que o tempo deixou cahir, entrámos a custo para vêr internamente o que restava d’este edificio religioso.


Apenas uma pia de agua benta, no seu lugar primitivo, embebida na parede, á direita da entrada. Para o fundo da capella nada se poderia vêr conquistado pelas silvas.


Transportámo-nos então ao largo fronteiro á egreja, aonde antigamente havia uma ponte, hoje substituida por um aqueducto, em virtude do alteamento que ali se fez de terreno com a passagem da estrada da Chan que vae ligar-se mais longe á de Mira.~


Presenceámos n’aquelle local o derruimento de muros, occasionado pela cheia do ribeiro, em novembro do anno passado, na occasião d’uma chuva torrencial que então cahiu pelo espaço de mais de quatro horas.~


Os muros foram levantados, e como guarda ao aqueducto pelo lado do poente, mandou a junta da parochia collocar uma grade de ferro.


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Chegados a este ponto é occasião de fallarmos da existencia d’uma pequena capella, que demorava a uns cinco minutos da egreja, no antigo caminho da Chan de que já fallámos. Não teria mais de quatro metros de comprido por dois de largo, estando quasi de todo em ruinas, na epocha em que a vimos, 1864.


Restavam d’ella sobre o lado norte da estrada, alguns metros acima, a parede de traz, com a respectiva empena, a que estava ligada uma pedra que havia servido de altar, e as paredes lateraes e da frente, dessiminadas em escombros. Era conhecida pela denominação - do Senhor da Chan. (Gazeta da Figueira - 18.4.1896)

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