sábado, 22 de setembro de 2012

Quadros - Os Senhores de Tavarede - 22


Foram muitos os requerimentos que João de Almada fez na tentativa de retirar da posse de sua mãe os seus bens. Temia, diz ele, que ela dissipasse os bens que herdara da Viscondessa de Condeixa, da mesma forma que dissipara os bens da Casa de Tavarede. Foram ouvidas muitas testemunhas, de ambas as partes, mas a verdade é que foi dada razão a D. Antónia Madalena, como refere o despacho do corregedor que julgou o caso … seria muito violento privar de modo tão sumário D. Antónia Madalena de uma Casa que era sua por direito próprio… E por decisão do Desembargo do Paço, de 16 de Março de 1829, o assunto ficou encerrado para sempre.

            Parecia, agora, que D. Antónia Madalena, então com 55 anos de idade, iria passar a ter uma velhice tranquila na sua casa de Lisboa. Mas não foi isso que sucedeu. A Morgada de Tavarede era uma liberal. Tinha sofrido enorme desgosto por seu filho ter assumido o absolutismo. Não sei, na verdade, se o liberalismo da nossa fidalga era uma verdade indiscutível ou se seria levada a isso por oposição a seu filho. Na verdade muitas foras as vezes em que ela invocou seus títulos e os de seu marido, defendendo a sua posição.

            Mas sabe-se que o seu mordomo, João Anselmo, e o padre capelão José Vitorino de Sousa, natural de Formoselha, que tomara a seu serviço aquando passara a residir em Lisboa, eram liberais e convictos. E tambem se sabe que, no dia 4 de Julho de 1832, pelas 2 horas da noite, o Corregedor do Crime de Alfama, com o escrivão e acompanhados por tropas da Guarda Real da Polícia e dos Voluntários Realistas de Castro Daire, entraram no seu palácio, sito no ‘pátio da Tavarede’, na Rua do Grilo, levando presos todos quantos ali se encontravam.
           
                A 7 de Julho de 1832, requer D. Antónia, por seus priivilégios e por ser presa por uma denúncia vaga de crime político, por suas doenças perigosas, como há quatro dias se acha sem socorros médicos, incomunicável no segredo da Corte, para Sua Majestade a mandar para onde lhe aprouver, mas onde a suplicante possa evitar a morte. E no dia 10 de mesmo mês, foi emitido um régio aviso,  mandando-a ser transferida do segredo da cadeia da Corte para o Mosteiro de Santa Joana. Alegava-se, então, que havia papéis subversivos apreendidos em sua casa. E no dia 21 de Julho seguinte, foi entregue no referido Convento Real de Santa Joana, para julgar os crimes cometidos contra a Augusta Pessoa de Sua Majestade El-Rei Nosso Senhor e segurança do Estado.

            D. Antónia já havia sido interrogada. Aqui fica a nota deste interrogatório. Ano de 1832. Aos 6 de Julho do dito ano, nesta cidade de Lisboa e cadeira da Corte, onde veio o dr. Jerónimo Moreira Vaz, Corregedor do crime do Bairro de Alfama, comigo escrivão do seu cargo e o assistente no fim assinado, aí mandou chamar à sua presença a D. Antónia Madalena de Quadros e Sousa, presa na dita cadeia, e depois de lhe deferir juramento dos Santos Evangelhos quanto a terceiro, lhe fez as seguintes perguntas. E eu, José Joaquim Galvão, o escrevi.
            E perguntado pelo nome, filiação, naturalidade, morada, estado e idade, respondeu chamar-se D. Antónia Madalena de Quadros, filha de José Juzarte de Quadros e Dona Joana Madalena Leite, natural de Tavarede, moradora da Estrada do Grilo, em Lisboa, é viúva de Francisco de Almada e Mendonça, e tem de idade 58 anos, incompletos.
            E perguntada quando, aonde, por que ordem e por que motivo foi presa, respondeu que fôra presa na noite de 3 para 4 do corrente, em sua casa, por ordem do Ministro e que ignora o motivo.
            E perguntada há quanto tempo viviam em casa dela, interrogada, Joaquim Pessoa da Silva Amorim, natural de Castelo Branco, António Manuel da Silva Broa, natural do Sardoal, e que foi alferes do novo regimento de infantaria de Lisboa, e José Maria Rodrigues, natural da freguesia de Santa Cruz, do cartel desta cidade de Lisboa, e o Padre José Vitorino de Sousa, natural de Formoselha, e que mais pessoas eram frequentes em sua casa, ou por visita ou em efectiva residência.
            Respondeu que Joaquim Pessoa da Silva Amorim, há 5 ou 6 meses na casa dela interrogada, e António Manuel da Silva Vieira Broa, que reside na casa dela, interrogada, há 3 meses, e José Maria Rodrigues residia em casa dela, interrogada, haveria um mês, pouco mais ou menos, e que o seu padre capelão José Vitorino de Sousa, reside na casa dela, interrogada, há 5 anos, e que não tinha visitas.
            E perguntada se antes de admitir na sua casa, e na sua companhia, os referidos Joaquim Pessoa da Silva Amorim, António Manuel da Silva Vieira Broa, José Maria Rodrigues, examinara ela, interrogada, como devia examinar, a conduta religiosa, moral e política destes indivíduos, e os títulos por que eles puderam legalizar a sua residência na Corte, principalmente aqueles que dela não serão naturais.
            Respondeu que há 3 anos, pouco mais ou menos, que Joaquim Pessoa da Silva Amorim frequentou a casa dela, interrogada, visitanto o seu administrador João de Melo Barreto de Eça, com o qual tomou conhecimento numa hospedaria e contraíram tal amizade que o referido Joaquim Amorim, frequentando por este motivo a casa dela, interrogada, lhe pediu o deixasse residir nela, ao que  anuiu ela, interrogada, não lhe investigando a sua conduta, não lhe importando o que ele fazia, e quando o via era a reunião do almoço, jantar e ceia; e que António Manuel da Silva Vieira Broa era conhecido dela, interrogada, há muito tempo, bem como a família dele, e por isso o admitiu em sua casa e lhe permitiu que nela vivesse, ignorando o seu emprego militar, no que reconhece o seu pouco cuidado e sua culpa; e que José Maria Rodrigues foi conduzido a casa dela, interrogada, por um seu tio, chamado Fortuna, caserneiro, por ocasião de visita e jogo de voltarete, e tomando depois conhecimento, o dito José Maria Rodrigues, com os filhos do administrador dela interrogada João José de Melo Barreto de Eça, lhe pediram aqueles que o deixasse persistir em sua casa, ao que ela interrogada anuiu, ignorando que ele tivesse culpas.
            E por ora ele Ministro não fez mais perguntas à respondente, que sendo-lhe lidas disse estarem conformes e que as respostas as ratifica, e assinou com a respondente e nós escrivães, em fé de verdade. E eu José Joaquim Galvão o escrevi e assinei.

            Para recordação, e porque talvez venha a interessar a alguém, a seguir transcrevo algumas passagens do processo: TESTEMUNHAS               João Gregório de Melo Barreto d’Eça, filho de João de Melo Barreto d’Eça e de D. Maria do Carmo Teles de Melo, natural da Figueira, morador na Calçada de Santo André, 68 – 2º andar, não tem emprego… “… é certo que na dita casa de D. Antónia Madalena de Quadros e Sousa existia um outro réu de lesa-majestade, o doutor Paula, da Figueira, amigo dele interrogado, seus pais e irmãos, a quem davam ali por brincadeira o nome de Thypalos, e que este fôra o que se evadira à justiça na noite de 4 do corrente, em que ali o pai e irmãos dele interrogado, a dona da casa e outras pessoas foram presas…”. (Negou)

            Perguntas a Joaquim Pereira da Silva Amorim – 3ªs perguntas – 23 de Julho de 1832:
            “E perguntado quem era  um outro réu e culpado que se achava em casa de D. Antónia Madalena de Qiadros e Sousa, na noite em que ele interrogado, e outros ali foram presos, escapando-se aquele réu à prisão.
            Respondeu que àquela casa costumava ir de visita, e algumas vezes pernoitava, um outro chamado Paula, da vila da Figueira, e que reside em Lisboa, mas que não tinha dito, a ele interrogado, onde era a sua morada e que ignorava se ali estava.
            E perguntado se ele conhece a letra daquele doutor Paula, respondeu que o viu escrever algumas vezes e que apresentado-se-lhe a letra pode dizer se sim ou não a conhece.
            E perguntado se àquele Paula davam na referida casa o nome de Thypalos, respondeu que um francês, chamado Messidor, que estava em casa de D. Maria de Noronha, vizinha da casa onde estava ele interrogado, e ia este doutor Paula, lhe chamavam muitas vezes Thypalos.
            E perguntado se conhece a letra do bilhete de folhas 86 dos autos e da carta  de folhas 87 dos mesmos, que lhe foi mostrada: que tanto aquele como este estão assinados com o nome de Thypalos. Respondeu que não conhece bem a dita letra e que nunca vira que aquele doutor Paula se assinasse Thypalos. E perguntado onde reside este doutor em Lisboa: reaspondeu que não sabia.

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