sábado, 6 de abril de 2013

O Associativismo na Terra do Limonete - 17


        Na SIT, num espectáculo realizado no dia 6 de Abril de 1912, foi representada, além de uma comédia, uma revista sobre os usos e costumes da terra. Como dissémos, a Sociedade de Instrução realizou no sábado uma récita com a revista intitulada Na Terra do Limonete e a comédia Birras do Papá. Fazer uma revista de costumes de Tavarede, terra pequena, em que escasseia o assunto e há sobretudo o receio de melindrar as personalidades atingidas, não é tarefa muito fácil. Daremos, porém, em poucas palavras, a nossa humilde opinião: - os artistas compreenderam bem os seus papeis, imprimindo-lhes muita graça e naturalidade. A revista foi admiravelmente ensaiada por Vicente Ferreira. O cenário, obra de Jean Batout produz magnífico efeito. A música, composição de Gentil Ribeiro, tem números lindíssimos e boa execução e, já que falamos em música, não esqueceremos Eugénia Tondela e António Graça, que cantaram corretamente as canções que lhe foram destinadas. Houve aplausos em barda, especialmente na parte final (apoteose), em que D. Limonete estabelece o confronto entre o convívio deletério da taberna e a paz e a fraternidade que predomina no seio da Sociedade d’Instrução. No próximo sábado repete-se a revista.

          Apesar de terem começado a surgir diversos atritos entre as duas associações, ambos os grupos dramáticos continuaram a desenvolver intensa actividade. Enquanto a Sociedade prosseguia com a apresentação do programa acima, o Grupo fez representar o drama Crime e Honra e duas comédias A mala do sr. Bexiga e O cometa e o fim do mundo.

         Uma das questiúculas referidas, foi publicitada em Junho daquele ano. Algumas pessoas que haviam subscrito para a aquisição d’um relogio para a torre, tendo conhecimento da infame cilada de que foi vitima a benemerita Sociedade d’Instrução Tavaredense, aplicando-lhe uma multa por suposta transgressão da lei do selo, ofereceram generosamente essas quantias à diréção da referida colétividade para não onerar o cofre com que esta sustenta há anos as suas aulas nóturnas para as classes trabalhadoras.
         Com a generosidade das pessoas de bem, está satisfeita a ganancia dos beleguins fiscaes, única protéção oficial que a Sociedade tem recebido para prosseguir na sua missão d’instruir os pobres.

         Um agrupamento musical, que veio a dar origem à tuna do jovem Grupo Musical, foi actuar a vários locais, obtendo bastantes elogios. E, reatando uma velha tradição, organizou uma festa para comemorar o S. João, com um arraial, no Largo do Forno, que estava lindamente ornamentado e iluminado a acetilene e à veneziana.

         Em Agosto foi comemorado o primeiro aniversário do Grupo, de que recordamos esta nota: Foi dada posse á nova Direcção, e Annibal Cruz, n’um breve discurso, apoiou a florescente collectividade local, incitando a nova Direcção a trabalhar com o mesmo afinco como o fez a transacta, para seu engrandecimento e da nossa terra. Dirige algumas palavras de felicitação ao regente do Grupo, pela maneira incansavel como tem leccionado aos seus socios a sublime arte de Mozart e entrega-lhe um objecto de prata offerecido pela sympathica sociedade, que João da Simôa agradece commovido. Levantaram-se no final enthusiasticos vivas ao Grupo Musical de Tavarede, que foram unanimemente correspondidos.
          Executa-se em seguida uma valsa e sóbe o pano para Mario José recitar a excellente poesia patriotica Vinga pae!, que foi bastante applaudida. Com graça recita depois o monologo Eu cá não me ralo... o sr. Antonio Dias Cardoso, de Quiaios, e o sr. Americo Alvitro d’Abreu, habil amador portuense, cantou a engraçada cançoneta Rebenta a bexiga, que foi bisada. Não me amava, hilariante monologo que Izidoro Ladeiro disse com agrado.
         O nosso patricio e jovem amador Antonio Medina Junior recitou tambem uma poesia dedicada ás damas de Tavarede, que a assistencia applaudiu bastante.   Fechou o sarau dramatico a comedia em um acto O cometa e o fim do mundo, desempenhada por dois socios do Grupo. Ás 24 horas e meia principia o baile que terminou ás 7 horas de domingo.
        
         Ao lermos os jornais daq       ueles tempos, fomos surpreendidos com uma declaração, inserta num jornal em Novembro, três meses depois daquela sessão, da autoria de Aníbal Cruz, correspondente local de um periódico figueirense e que fazia parte dos corpos sociais do Grupo. Annibal Cruz declara, para os devidos effeitos, que pediu a demissão de secretario d’assembleia geral, como tambem de socio, do Grupo Musical Tavaredense, que lhe acaba de pagar com coices tremendos – não é de estranhar, porque já d’isso se queixavam pessoas illustradas e estimadissimas – os favores que lhe fez e mesmo por não querer estar onde predominam absolutos e ignorantes, que combatem a instrucção e apoiam o vicio da taberna!!!


         Faz esta declaração para que não o julguem elemento da cambada que incommóda a população da sua terra.

         Foi o início de violenta polémica que envolveu a jovem associação e seus directores, a qual acabou no Tribunal Judicial da Figueira. Porque está inteiramente relacionada com a colectividade, não podemos deixar de aqui inaserir algo da mesma.          Sr. redactor da Gazeta da Figueira – O Grupo Musical Tavaredense pede-lhe a fineza de publicar no seu muito lido jornal uma declaração justa e verdadeira, e não como uma egual que sahiu no seu jornal de 16 do corrente, feita pelo sr. Annibal Cruz, que mal empregado é este nome de Cruz em tal pessoa, por pertencer a uma familia tão digna com o mesmo nome. O nome mais acertado para este cavalheiro era de vadio. É pena que a policia o não tenha apanhado na rêde e leval-o para o canil, porque estão lá outros com mais raciocinio.
         Querem os leitores saber os sacrificios que este cavalheiro tem feito pelo Grupo, de que elle diz pedira a demissão, o que mente descadaramente? A demissão que elle diz ter pedido, queriamos nós dar-lh’a, talvez accompanhada com alguns P. na primeira occasião que elle entrasse á porta d’esta associação, devido a uma calumnia que elle levantou contra um rapaz digno, e compromettendo-nos a todos. Mas o garoto parece que adivinhou o que lhe succedia. O sacrificio foi este:
         Na fundação d’este Grupo, que tem apenas 15 mezes de vida, este cavalheiro foi pessoalmente offerecer-se para socio, o que muitos recusaram, outros acceitaram, apontando-lhe o seu prestimo, que era para ponto, mas que ponto este ponto sahiu! A fazer o que tem feito n’outras sociedades que tem sido desconsiderado. A pesar de tudo foi acceite, prestando em principio o seu serviço, depreciando, tratando pessimamente mal e a ridiculo, nas suas cartas de Tavarede, certos cavalheiros que para não sujarem as mãos o desprezaram como deviam, e agora, a estes mais escandalisados, anda elle como um cão submisso, ajoelhar-se aos pés, para lhe engraixar as botas. Pois do Grupo, desde a classe trabalhadora até ao mais elevado, lhe dão o desprezo que elle merece.
         Pois como iamos dizendo, devido ao seu trabalho, o que esse cavalheiro diz lhe pagarem com coices tremendos, foi unicamente apontar dois espectaculos, e depois voltou á mesma do costume e desprezando o seu cargo a que se tinha responsabilisado, tendo nós escolhido outro para exercer o seu logar.
         Decorreu algum tempo, approximou-se o anniversario do Grupo, e este cavalheiro encarregou-se de se fazer secretario da assembleia geral, o que acceitámos a custo, julgando que elle se regenerava, mas não aconteceu isso. Desde esse dia nunca mais frequentou este Grupo, porque a sua pousada era na Figueira, nos sitios mais vergonhosos, praticando acções ridiculas, a ponto de uzurpar ás infelizes algum dinheiro. Se quizer provas dão-se-lhe.
         O pouco tempo que está em Tavarede é para calcar a pés a sua doutrina do costume contra os taberneiros, e ainda no domingo, 10, pela ultima vez, em casa d’um dos taberneiros, estando elle com o vinho, praticou uma infamia, como filho nenhum de Tavarede, infamia esta que temos pejo de publicar por ser vergonha praticar-se na nossa terra.
         E chama-nos o garoto absolutos! O contrario. O absolutismo creou-se só para este cavalheiro. Faz e diz o que quer e ninguem lhe pede contas, porque não merece importancia. Merece só, como dizemos, de todos o desprezo como se dá a um cão vadio.
         Desde já, sr. redactor, lhe agradece muito penhorado o Grupo Musical Tavaredense.

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