sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Usos e Costumes da Terra do Limonete - 2

A primeira notícia encontrada referente às festas ao São João de Tavarede foi no periódico O Figueirense, na edição de 10 de Julho de 1864. “Terminaram no domingo finalmente os festejos aqui pelas proximidades da villa ao milagroso S. João. É a antiga villa de Tavarede quem todos os annos, permitta-se-nos a expressão, cobre a rectaguarda neste famoso e nunca alterado systema de festejar o santo com mascarada, cavalhada, corridas de prémios, etc.
Como succede todos os annos, pela volta do meio dia appareceu a bandeira seguida de numerosos cavalleiros, uns mais bem, outros mais mal montados, mas todos fazendo-se conduzir por um quadrupede de qualquer especie, que é o que se pretende e contra o que não há disputa. Deram as competentes voltas em torno da egreja, desceram depois à praça do Commercio e em seguida à praça Nova, d’onde dadas também as competentes voltas, se encaminhou a cavalgada para o porto da saida, que subsequentemente se ia tornar o theatro de maior gloria.
Depois das 2 começou então a Figueira a despovoar-se, encaminhando-se toda a gente para o local da festa, aonde se reuniram pelo meio da tarde extraordinário numero de pessoas de todas as classes. É que nestas occasíões não há fidalgos nem plebeus: a mascara e os mascaras confundem tudo.
Alli o que principalmente se viam eram numerosos ranchos de rapazes e raparigas da Figueira, Buarcos, e da própria localidade, que todos, ou dentro das casas ou na rua, tocavam, cantavam, berravam e dançavam á porfia, como quem queria para si maior gloria. De resto também se encontrava um bom numero de mirones, que não faltam nunca nestas occasiões, uns para se divertirem, vendo; outros, para darem fé do que se passa.
Quando o sol já era menos e permitia ás cabeças naturalmente esquentadas o exporem-se aos seus vivificantes raios, começou então um simulacro de corridas de prémios, que se não era cousa para admirar como bom, era contudo excellente cousa para fazer rir e fez rir muito.
Acabada a corrida veio-se aproximando o frio da noite, que não deixara de chegar muito a propósito, começando o povo a retirar; e nós, que também éramos povo, viemos vindo com a multidão, protestando desde logo escrever uma larga notícia sobre o S. João de Tavarede, em virtude d'um cavaco que nos deu um nosso amigo, por fallarmos no numero passado do Figueirense tão resumidamente do S. João que ha de vir”.
         Esta nota refere dados interessantes. É certo que não tem qualquer alusão a actos religiosos, no entanto, pelo menos era celebrada missa sanjoanina. Também se depreende da notícia, e o segundo período da mesma é elucidativa, estas festas já se realizariam haveria anos. Mas, desde quando?
         Pois a verdade é que não conseguimos encontrar quaisquer indicações do início de tais festejos, bem como o motivo da nossa terra, e outras do concelho, festejarem tão exuberantemente tais festejos.
         Na Figueira, como se sabe, ainda actualmente se realizam festas em honra do Santo, aliás, um dos três patronos venerados na cidade: o S. Julião, padroeiro da terra, o Santo António, e recordemos a figura de António Fernandes de Quadros, o fundador da Casa de Tavarede, e a quem se deve a construção do convento, e o S. João, com o tradicional ‘banho santo’, sempre atraíndo muito gente, velhos e novos, para se banharem nas águas frias da nossa praia.
         A Figueira sempre festejou no dia próprio, a 24 de Junho. Na primeira semana de Julho cabia a Buarcos realizar os festejos, que, na semana seguinte, acabavam em Tavarede.
         Tinham muita fama as festas ao S. João de Tavarede. Certamente que a sua realização não seria anterior à mudança da câmara da nossa terra para a Figueira, o que aconteceu no ano de 1771. Até então, ‘reinando’ despoticamente em Tavarede o morgado Fernando Gomes de Quadros, que tão triste memória deixou, não é crível que o povo tivesse qualquer vontade ou, até, autorização para tais festejos.
         Também é verdade que não interessa grandemente saber a data rigorosa do surgimento destas celebrações. Admitimos, sem qualquer segurança, que tenham começado nos inícios do século dezanove, talvez na segunda ou terceira décadas.
         Se as danças atraíam especialmente a gente nova, já os menos jovens teriam o ponto alto das festas nos costumados jogos tradicionais, especialmente a rosquilhada, que proporcionava momentos de boa disposição. Eram as cavalhadas, porém, que constituiam o pico dos festejos. Naqueles tempos, sendo a agricultura a principal actividade das gentes locais, a terra seria fértil em animais, indispensáveis ao cortejo. Burros e cavalos, além de montadas para muitos participantes, eram necessários para atrelar às carroças e trens, vistosamente ornamentados a preceito.
  


As cavalhadas na Figueira, no largo da Câmara

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