sexta-feira, 7 de março de 2014

O Associativismo na Terra do Limonete - 66

         Igualmente a Direcção da  colectividade se associou ao êxito desta peça, tendo registado no seu relatório anual um agradecimento a todos os seus colaboradores. Esta peça exigiu dos seus Autores um trabalho exaustivo, só muito palidamente avaliado por quem de mais perto com eles tratava. Tanto os amadores antigos como os que agora entraram de novo, tiveram nesta peça ensejo de demonstrar a sua boa vontade ensaiando sem descanço, todas as noites, durante cerca de dois meses, para que a peça fosse apresentada na data marcada, o que, por várias razões, era muito importante. Foi um esforço fora do vulgar que a direcção muito sinceramente agradece e que torna os componentes da nossa já famosa secção dramática cada vez mais dignos do reconhecimento da assembleia geral.
         Na impossibilidade de registar aqui os nomes de todos os figurantes e demais os numerosos amigos que, de qualquer forma, prestaram o seu concurso, contribuindo assim para o êxito que “Chá de Limonete” obteve, seja-nos permitido citar o sr. José Nunes Medina que, tomando a seu cargo a parte musicada, foi um bom auxiliar do sr. José Ribeiro. Quando se pensou pôr em cena esta peça, foi posta de parte qualquer ideia de lucro; antes pelo contrário: contava-se em que a receita nunca chegaria a cobrir a elevada despesa que a mesma acarretaria. Porém, como se tratava duma peça educativa, com fundo histórico, que mostrava aos tavaredenses (e aos estranhos) muita coisa que desconheciam sobre a sua terra, resolveu-se ir para a frente, isto é, pô-la em cena, embora o resultado financeiro fosse mais que duvidoso”.
         Verificou-se, porém, que depois de 14 representações seguidas, uma das quais no Casino Peninsular, sempre com o maior agrado do público e as mais elogiosas, e algumas delas, honrosas referências, tanto à peça como ao desempenho, “Chá de Limonete” não só está pago mas ainda apresenta saldo.
        
         A colectividade, considerando o enorme interesse dos tavaredenses em conhecer a história da sua terra, mandou editar Chá de Limonete em livro. Tanto a imprensa como diversas entidades, prestaram públicos elogios ao trabalho. Transcrevemos, somente, uma das notas publicadas da imprensa diária.
                Mais e mais temos de nos convencer de que Portugal não é só Lisboa: está ante nós uma xícara do delicioso “Chá de Limonete”, que é uma lição muito para meditar…
         Em uma pequenina aldeia, lá para as bandas da Figueira da Foz, existe uma agremiação notável: deve ser pobre, pelo modesto centro onde actua e pela exiguidade das quotas dos seus sócios mas é rica de boa vontade e dedicação; é rica pelo fim que tem em vista e cumpre denodadamente – é a Sociedade de Instrução Tavaredense. A forma de cultura que adotou é a instrução pelo teatro. E assim instrui, educa e distrai.
         Mantem o seu grupo cénico mas, para bem cumprir o seu mandato, cada peça a representar é o pretexto para uma alegre e proveitosa lição, desde a explicação dos vocábulos pouco acessíveis aos menos cultos, até ao estudo da divergência de géneros e estilos, ao esclarecimento de épocas, usos e costumes.
         E há 30 anos que dura esta acção cultural!
         Pois foi ao serviço da simpática e prestimosa Sociedade Cultural de Tavarede que José da Silva Ribeiro colocou o seu mérito de escritor dando ao grupo cénico a fantasia “Chá de Limonete”. E aqui, com esse trabalho, surge outra lição – lição de aprumo, lição de moral. O “Chá de Limonete” prova aos nossos revisteiros, que tão frequentemente recorrem à obscenidade, que se pode fazer trabalho meritório, teatro movimentado, atraente, sem abandonar a linha de decoro, sem esquecer que a principal e mais alta missão da cena é educar e moralizar, que para criar a beleza não é necessário estadear no palco montes de carne nua.
         Às qualidades apontadas, o reconfortante “chá” junta ainda a alegria e a arte.
         Esta peça tem uma curiosa novidade: é uma proveitosa lição de história. Levezinha, que o público a quem se destinou não está ainda em condições de profundar muito. Poderíamos chamar-lhe revista histórica ou monografia teatralizada.
         Os sucessos, interessando o local, desde a sua antiquíssima origem, vão sendo referidos pelo “Velho Tavarede”, o respeitável ancião que tudo presenciou… E os quadros vão-se sucedendo, na mutação de revista e o público vai tomando conhecimento, a sorrir, do que foi a sua terra.
         Original e muito interessante.
         Mas o “Velho Tavarede” é tão velho, tão velho, que embora sabedor e de memória prodigiosa, já vai tendo lapsos, percalços de senilidade… E, por isso, e só por isso, se lhe teria varrido da ideia aquele convento das freirinhas da Esperança e o outro, o convento quinhentista e ainda, esquecimento de maior monta, o nome do nobre, douto e piedoso Dom Francisco de Mendanha, talvez o mais notável filho de Tavarede, que, depois de ter cursado letras em Paris, como ao regressar à pátria já tivesse falecido seu avô, renunciou ao Mundo procurando a paz do claustro. Mas aí, o douto cruzio, teve de exercer cargos de alta importância na sua Ordem.
         Facto interessante: foi D. Francisco de Mendanha quem assistiu como Cancelario da Universidade de Coimbra ao acto de “Mestre em Artes” do infeliz Rei D. António, Prior do Crato.
         Mas a mão já trémula do simpático Velho Tavarede deixaria cair de entre os outros o pergaminho onde em letras de oiro estava escrito o nome do culto e piedoso D. Francisco de Mendanha.
         Bastaria a cena do acto de “Mestre em Artes” de D. António, com a assistência do Cancelario D. Francisco de Mendanha, para dar um final grandioso a qualquer dos actos da sua fantasia.
         E poderia talvez influir com esse trabalho para se dar a uma rua de Tavarede o nome do nobilíssimo e notável padre cruzio D. Francisco de Mendanha.
         “Chá de Limonete”… Limonete, Lúcia-lima, erva-luísa, bela-luísa, doce-lima… Chá perfumado que o nosso paladar muito aprecia e que recomendamos como remédio já muito antigo contra as dores de estômago, especialmente as desses estômagos delicados que não conseguem digerir as revistas que por aí pululam…

         Muito digno de leitura por elucidativo e bem escrito, o prefácio.

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