sábado, 1 de novembro de 2014

O Associativismo na Terra do Limonete - 100

         Para integrar o programa comemorativo do aniversário, em Janeiro de 1973, nova peça de Shakespeare foi levada à cena. Assistimos no passado sábado à récita de aniversário da Sociedade de Instrução Tavaredense, que sempre tem primado por apresentar bom teatro, e mais uma vez demos por bem empregue a nossa deslocação à vizinha Tavarede.
         Mestre José Ribeiro não proferiu a habitual palestra que antecede as estreias, mas leu o prefácio que escreveu sobre a peça “Conto de Inverno”, de William Shakespeare, que pela primeira vez era representada em Portugal, em língua portuguesa, já que em 1939 fora apresentada em Lisboa por um grupo de ingleses e estudantes da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, em récita particular.
         Com “Conto de Inverno”, Shakespeare esteve presente pela terceira vez em Tavarede. A primeira em 1964, por ocasião do seu 4º. centenário  com a “mui excelente e lamentável tragédia Romeu e Julieta”, sem dúvida a sua mais popular obra, adaptada ao teatro e ao cinema em variadíssimas versões. Quatro anos depois o dramaturgo inglês voltou ao palco de Tavarede com o Dente por Dente, com adaptação de Luís Francisco Rebelo, e agora com Conto de Inverno, traduzida e adaptada por João José, pseudónimo artístico de José Ribeiro.
         “Conto de Inverno”, uma quase tragédia em 5 actos e 10 quadros, foi representada na corte de Jaime I, em 5 de Novembro de 1610, seis anos antes da morte do seu autor, Alma do século, Monumento sem túmulo, Doce cisne do Avon, como Shakespeare foi classificado por Bem Johnson.
         José Ribeiro disse que “Conto de Inverno” tinha qualidades para agradar a crianças e a adultos, e, de facto, assim é.
         Concebida longe dos moldes de “Hamlet”, “Romeu e Julieta”, “O mercador de Veneza”, e outras, a peça ora apresentada em Tavarede conta-nos a história do ciumento Leontes, rei da Sicilia, que pretendeu matar o seu pretenso rival Polixenes, rei da Boémia, mandou abandonar sua filha recém-nascida num monte deste país e fez julgar Hermione, sua mulher, por crime de adultério, de que estava inocente conforme depois foi confirmado pelo Oráculo de Delfos.
         A peça tem um final imprevisto e acaba bem, reconhecidos que foram os infundados ciúmes de Leontes.
         Nada menos de 37 são as personagens que intervêm em “Conto de Inverno”, que conta com a participação dos “veteranos” João Cascão, Violinda Medina e Silva, Fernando Reis, João de Oliveira Junior e José Luiz do Nascimento.
         Boas presenças de José Medina, João Medina, José Santos, Manuel Cerveira, Luiz Medina, Ana Cristina de Oliveira, Rosa Maria da Silva, etc.
         A cenografia é do prof. Manuel de Oliveira e de José Maria Marques, com um excelente guarda-roupa de Alberto Anahory que, como sempre, primou por apresentar luxuosas indumentárias da época.
         A encenação é do nosso já consagrado e competente José Ribeiro que, como as que tem apresentado no palco da SIT, lhe deu todos os condimentos necessários para fazer de “Conto de Inverno” mais um assinalado êxito para os amadores de Tavarede.

         E registamos que a Câmara Municipal da Figueira da Foz deliberou condecorar a colectividade. Por proposta do então vereador do pelouro da cultura, sr. dr. Marcos Lima Viana, a edilidade cessante, com plena concordância do sr. Presidente da Câmara Municipal, aprovou por unanimidade a concessão da MEDALHA DE OURO DE SERVIÇOS DISTINTOS às prestigiosas colectividades da nossa terra – SOCIEDADE FILARMÓNICA FIGUEIRENSE e SOCIEDADE DE INSTRUÇÃO TAVAREDENSE – galardão a que ambas fizeram mais do que inteiro jus, através duma notável, vasta e prolongada acção cultural, artística e beneficente sobejamente conhecida de todos os figueirenses para que seja necessário referi-la em detalhe, comentá-la e exaltá-la. O que constituiria uma redundância e também de certa forma de injustiça aos sentimentos de gratidão dos nossos conterrâneos, que pelas duas agremiações homenageadas nutrem bem sinceras, palpáveis e comprovadas, simpatia, estima e consideração, a que o bairrismo junta o sal de um grande orgulho por as ter no seu seio e pela maneira exemplar como têm servido e honrado a Figueira, orgulho sob todos os aspectos tão compreensível como legítimo.
         Por tudo o que fica dito e o mais que é do conhecimento geral, de ânimo gratíssimo, por nossa parte nos associamos jubilosamente a esta merecida consagração municipal dos méritos e serviços à terra e à grei, tanto da Sociedade de Instrução Tavaredense como da Sociedade Filarmónica Figueirense, a ambas, na emergência, apresentando os nossos melhores cumprimentos e felicitações.

         O IV Centenário da Publicação de Os Lusíadas também teve a participação do grupo tavaredense. O presidente da Comissão Nacional das Comemorações, Professor Dr. Hernâni Cidade, veio à nossa terra assistir a um espectáculo. Conforme já aqui tivemos ocasião de noticiar, o categorizado grupo cénico da benemérita Sociedade de Instrução Tavaredense (quase 70 anos de permanente actividade, posta, com a maior devoção e ternura, ao serviço da cultura popular), mais uma vez voltou a dar amplas provas do seu reconhecido valor e da sua incontestada capacidade artística.
         E mais uma vez soube impor os seus relevantes e incontestados méritos, numa aceitação total, plena de emoção e de delirantes aplausos, perante um público categorizado e exigente, em que se encontravam gradas personalidades de Lisboa, Figueira, Coimbra, Leiria, etc., etc., algumas das quais se habituaram, desde há muito, a ir ao encontro dos amadores-artistas de Tavarede, nas suas representações teatrais – para as apreciar e aplaudir, não por mera e generosa benevolência, mas por convicção e inteira justiça.
         Sábado, 4 de Novembro. Mais um espectáculo, no elegante e confortável teatrinho de Tavarede (totalmente remodelado e beneficiado, há poucos anos, graças à generosa ajuda material da benemérita Fundação Gulbenkian), com a muito grata e honrosa presença do eminente Prof. Dr. Hernâni Cidade, ilustre presidente da Comissão Nacional das Comemorações de “Os Lusíadas”, que de Lisboa, acompanhado de outras também ilustres personalidades, ali se deslocou.
         O espectáculo comemorativo do 4º Centenário da Publicação de “Os Lusíadas”, de Luís de Camões, constava da representação do “Auto de El-Rei Seleuco”, da autoria do imortal Poeta; e de uma “Evocação”, em duas partes e dez quadros (a 1ª parte – “O Trinca-Fortes” (1551), com as cenas “Encontros no Mal-Cozinhado”, “A merenda da Infanta” e “Do tronco para a Índia”; e a 2ª parte – “Os Lusíadas” (17 anos depois), com as cenas “Regresso da Índia”, “… e ninguém mais falou nele!”, “Ante o censor dos Lusíadas”, “O Velho do Restelo”, “O Adamastor”, “Concilio dos Deuses” e “Quem compra os Lusiadas”, da autoria de mestre José Ribeiro, interpretada por mais de 50 dos seus briosos e consagrados pupilos; caprichosamente montada, vestida e encenada, sob o maior rigor, pelos apaixonados amigos da SIT, de Lisboa, srs. Alberto Anahory, que estudou e preparou todo o primoroso guarda-roupa, histórico e de fantasia; António Tomás, que gravou, amavelmente, a “Voz de Garrett” e a “Voz dos Lusíadas” e realizou toda a sonorização; José Maria Marques, que se incumbiu da cenografia, a todos os títulos brilhante e rigorosa, excepção feita a algumas cenas no “Mal Cozinhado” e do”Concilio dos Deuses”, com as quais foram evocados os ilustres e saudosos amigos daquela benemérita instituição cultural (que tanto tem sabido honrar a sua linda aldeia, senão o Concelho da Figueira e o próprio distrito de Coimbra, onde não é ignorado o real valor dos amadores teatrais tavaredenses), prof. Manuel de Oliveira e Rogério Reynaud (este figueirense) e o actual padre da paróquia local, dr. João Evangelista Amado, que orientou o cântico litúrgico.
         E – já agora – expliquemos os precedentes que motivaram tão louvável e patriótico movimento artístico e conduziram o José Ribeiro à decisão – a todos os títulos louvável – de procurar vincar, pelo teatro, na sua aldeia e pelos seus pupilos, esta histórica efeméride.
         Tendo sido previamente convidado – muito digna e acertadamente - pela Câmara Municipal (pelouro da cultura) para estudar a maneira de pôr em prática a representação, na Figueira da Foz, por intermédio do laureado núcleo dos seus amadores, uma peça alusiva à Comemoração do 4º Centenário da Publicação de “Os Lusíadas”, aquele nosso ilustre conterrâneo e muito prezado e velho amigo – coração de oiro e alma sempre aberta às mais elevadas e dignificantes iniciativas culturais e filantrópicas -, prontamente correspondeu a tão delicada incumbência…
         … escrevendo, ensaiando e preocupando-se, ainda, apaixonadamente – como é próprio dos seus brios e das suas reconhecidas exigência – com a montagem das peças a que acima aludimos…
         … e cujas representações (cremos que já em número de seis ou sete), quer na oficial – chamemos-lhe assim – realizada no Grande Casino Peninsular, que redundou, ao que nos foi informado, numa consoladora e delirante apoteose, tendo nessa altura sido conferida à veneranda Sociedade de Instrução, num relevante acto de consciência e de justiça, a Medalha de Mérito (Ouro) da Câmara Municipal, quer em Tavarede, redundou num assinalado e consolador êxito…
         … e numa grande satisfação e alegria para José Ribeiro e para os seus simpáticos e garbosos discípulos.
         E pressentimos este “fenómeno”, porquê?
         Precisamente porque – e tão sentimentais e dignificantes decisões não nos consta que houvessem sido tomadas por mais ninguém, no País, com mais possibilidades e obrigações morais para o fazer – mas não fez -, isso proporcionaria mais uma admirável oportunidade para provar que à humilde gente de uma linda aldeia portuguesa, toda devoção e paixão pelo teatro, não havia escapado mais uma data histórica e, como tal, sentiria orgulho em comemorá-la!...
         Assim, e a exemplo de que acontecera nas respectivas datas, em que na SIT, em Tavarede, foram comemorados, com a maior relevância e dignidade, o 5º Centenário de Shakespeare; o Centenário de Almeida Garrett; o Centenário do Infante D. Henrique; o Cinquentenário da Morte de D. João da Câmara e o Centenário de Marcelino Mesquita; se aos reconhecidos méritos dos amadores-artistas da linda terra do limonete tinha isso sido possível, essa grande honra, graças à batuta-mágica de mestre José Ribeiro, na sua qualidade de autor e ensaiador competentíssimo, porque não havia ele, acedendo, de ânimo jubiloso, ao que, em tal sentido, lhe fora solicitado oficialmente, de aproveitar a oportunidade para marcar, mais uma vez, uma relevante posição do seu admirável querer e das suas ricas possibilidades intelectuais e artísticas, escrevendo, ensaiado e pondo em cena a referida peça, comemorativa da patriótica efeméride do 4º Centenário da Publicação de “Os Lusíadas”, de Luís de Camões?
         Ora foi precisamente isso que se deu…

         E com que prestigiante elevação!... 

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