sábado, 13 de dezembro de 2014

Histórias e Lendas - 11

O morgadio de Tavarede
Origem e sua instituição






         Não se sabe ao certo a data de nascimento de António Fernandes de Quadros, filho de Aires Gomes de Quadros e de D. Brites Gil Barreto. Teve um irmão, mais velho, do mesmo nome de seu pai, que terá morrido na Índia, onde participou em diversos combates. Presume-se que António Quadros terá nascido no ano de 1475, em Tavarede, onde seu irmão, quando morreu, era possuidor de algumas propriedades que adquiriu por volta do ano de 1532.

         Quando atingiu a idade adulta ingressou na vida militar. “Daquela povoação, sede de um antigo couto pertencente ao cabido da Sé de Coimbra, era natural António Fernandes de Quadros, um desses cabos de gentes de guerra que as guiavam nas correrias e assaltos ao inimigo, nas praças de África, quando elas eram nossas, desde os heroicos tempos em que o Africano as conquistara, até que D. João III, avisadamente, as abandonaram, em meados do século dezasseis. Dessas praças a última que ocupámos foi Azamor, cujo nome retumbante soa com um eco das épocas da passada glória que tivémos”. (As Alfandegas, do dr. José Jardim).

         Foi companheiro de D. Jaime, duque de Bragança, na sua deslocação a África. E foi nomeado adail de praça de Azamor, por carta de 22 de Dezembro de 1516. “Dom Manuel, etc., a quantos esta nossa carta virem, fazemos saber que, confiando na bondade e discrição de António Fernandes de Quadros, cavaleiro da nossa Casa, que é tal para que nisto nos sirvam bem e com toda a fidelidade e lealdade que ao nosso serviço cumpre e a tal ofício pertence, e o dele confiamos e assim querendo-lhe fazer graça e mercê pelos serviços que dele temos recebido e ao diante esperamos receber, temos por bem e o damos ora daqui em diante, para Adail da nossa cidade de Azamor a si e pela maneira que o era Fernando de Almeida, que o dito ofício de nós tinha e agora faleceu, e assim como são os outros nossos Adaís dos outros nossos lugares de além mar, o qual ofício não haverá nenhum mantimento, somente queremos que o hajam todos eles por vez e percalços, honras e liberdades que ao dito ofício diretamente pertencem e assim como tudo dirigiu o dito Fernando de Almeida e das ordenações e direito têm e devem de haver os outros nossos Adaís e jurem, mandamos ao nosso capitão da dita cidade que agora é e ao diante for, e a quaisquer outros oficiais e pessoas que na dita cidade estiverem ao presente e ao diante forem, que o hajam daqui por diante por seu Adail e a outro nenhum não o metam em posse do dito ofício e lho deixem servir e usar dele e haver os ditos prós e percalços, honras e liberdades, a ele ordenamos como dito é, sem nisso lhe porem  dúvida e embargo algum, porquanto assim é nossa mercê, o qual jurou na nossa Chancelaria aos Santos Evangelhos, que bem e verdadeiramente obre do dito ofício, guardando a nós nosso serviço e as partes seu direito e que nos sirva nele com toda a fidelidade.
            Dada em Lisboa aos 7 dias do mês de Dezembro. Gaspar Rodrigues a fez.”

         Exerceu o cargo durante cerca de dois anos. Regressado a Tavarede em 1520, foi nomeado feitor da Alfandega de Buarcos e Juiz das Sisas de Tavarede, pelo rei D. João III, no ano de 1522.

         Entretanto, e depois do seu regresso de África, António Fernandes de Quadros casou com D. Genebra da Fonseca, uma fidalga de Montemor-o-Velho, filha de D. Brites Afonso Coutinho e de Lopo Fernandes de Azevedo. Esta senhora também era possuidora de diversas propriedades em Tavarede e o casal “mandou fazer naquele lugar umas casas nobres, que para aquele tempo em que a vaidade não lançava os alicerces, são em tudo grandes; tem uma torre com ameias, o que se não permitia senão a pessoas de grande qualidade, e são o solar desta família neste reino”.

         No dia 11 de Abril de 1520, em praça pública, emprazou ao cabido da Sé de Coimbra a lezíria da Oveirôa “que nunca fora aproveitada por se cobrir de marés”.

         “Saibam quantos este instrumento, deste dia para todo o sempre, virem, como aos onze dias do mês de Abril do ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil quinhentos e vinte, na cidade de Coimbra, dentro do Mosteiro de Santa Cruz, estando todo o Cabido no lugar costumado, onde os semelhantes autos se usam fazer, estando aí presentes e juntos em Cabido, o Cabido como é de costume chamados por campainha tangida especialmente para o auto de que abaixo se fará mensão, convem a saber os muitos honrados Gaspar Fernandes, prior crasteiro e vigário no dito Mosteiro, pelo muito excelente e reverendíssimo senhor o senhor Infante D. Pedro, Cardeal de Portugal, etc., perpétuo administrador do dito Mosteiro, e os outros Cónegos e convento dele e outrossim, estando ali o muito honrado Gregório Lourenço, cavaleiro da Casa de El-Rei nosso senhor e Vedor do dito Mosteiro pelo dito senhor Cardeal, e também estando ali António Fernandes, cavaleiro da Casa de El-Rei nosso senhor e adail da cidade de Azamor, logo ali foi apresentado pelo dito Vedor uma carta assinada por El-Rei nosso senhor, endereçada a ele dito Vedor, a qual vinha sobre este caso da qual carta é o teor tal como se segue de verbo adverbum.

Gregório Lourenço. Nós, El-Rei, vos enviamos muito saudar, vimos a carta que nos escrevestes sobre a lezíria que chamam a Morraceira, que nunca fôra aproveitada por a cobrir as marés, e o mais que sobre isso nos escrevestes, e havemos por bem vos mandarmos que mandeis meter um pregão à dita lezíria e se empraze em fatiota a quem por ela mais der de foro em cada um ano e logo o fazei. Escrita em Évora, a treze dias de Março de mil quinhentos e vinte. Jorge Rodrigues a fez.

E apresentada assim a dita carta como dito é, logo pelo dito Vedor foi dito que ele, em cumprimento da dita carta de Sua Alteza, mandara logo um mandado ao juiz da vila de Redondos, terra e jurisdição do dito mosteiro, o qual mandado outrossim apresentou do qual o teor tal é como se segue de verbio adverbum.

- Juiz da vila dos Redondos, terra e jurisdição do Mosteiro de Santa Cruz, Gregório Lourenço, rendeiro da Casa de El-Rei nosso senhor e Vedor do dito Mosteiro pelo senhor Infante Cardeal, etc., meu senhor, vos faço saber que El-Rei nosso senhor me mandou por sua carta, que mandasse apregoar quem quizesse aforar a ínsua da Morraceira, que é do dito mosteiro, que se chama Aveiroa, para se aforar em fatiota a quem se obrigar a aproveitar e por ela mais der, e portanto vos mando, de sua parte, que atento que estiverdes, façais apregoar por essa vila a dita ínsua, dez dias, cada dia um após o outro cada dia, dois pregões pelo menos, perante o tabelião dessa vila, ao qual outrossim mando, da parte do dito senhor, que os ditos pregões escreva e os lanços que sobre a dita ínsua fizerem, e passados os ditos dez dias me enviem o auto que se disso fizer, por instrumento público, para se sobre tudo fazer o que Sua Alteza manda e cumprir assim uma e outro com muita diligência. Feito em Arazede aos vinte e oito dias de Março de mil quinhentos e vinte. Nuno de Parada a fez.

E apresentado assim o dito mandado como dito é, apresentou mais uns autos dos pregões que se, por virtude do dito mandado, fizeram, os quais pareceram ser feitos e assinados por Pedro Anes Sousino, público tabelião da dita vila dos Redondos, os quais se continham que a dita insua da Aveiroa, andara em pregão pelas praças e ruas da dita vila. A dez dias contidos no dito mandado, em cada um dos ditos dias dois pregões, e assim se mostra não lançarem pelas certas pessoas moradoras em Tavarede e Buarcos e que feitas as ditas diligências, se não achava quem em ela mais lançasse que o dito António Fernandes de Quadros, que nela lançou de renda e pensão em cada um ano trezentos e vinte reis e isto segundo eu, tabelião público, vi e li em presença das partes e das testemunhas que adiante vão nomeadas. A qual carta e mandado e autos assim apresentados como dito é pelos sobreditos fins. Crasteiro, cónegos e convento e Vedor do dito mosteiro foi dito que por virtude da dita carta de Sua Alteza e assim das comissões que tem do dito senhor Cardeal para os tais aforamentos poderem fazer, os quais são em poder de mim escrivão e tendo já sobre ele feito as diligências necessárias e sentindo assim por evidente proveito do dito mosteiro e mesa do prelado a que pertence, eles aforaram como logo de feito, aforaram deste dia para todo o sempre, a dita lezíria da Morraceira, que antigamente se chamava da Aveiroa, ao dito António Fernandes, para ele e sua mulher Genebra de Azevedo, e para todos seus filhos, netos e geração que deles para todo sempre descender, a qual lezíria disseram as ditas partes que partia de uma parte com a veia do Mondego e da outra com a veia de Lavos. Convém saber desde o arinho dos ovos, donde se as ditas veias afastam até ao pontão onde se tornam a juntar, a qual propriedade fica no limite de Buarcos, saber defronte da foz do Mondego onde o dito limite chega no meio do rio, a qual lezíria lhe assim aforavam como dito é, com tal preito e condição e condição que eles emprazadores e os que deles para todo o sempre descenderem e paguem para sempre em cada um ano ao dito mosteiro os ditos trezentos e vinte reis de foro e renda e pensão e haverão para si todo o proveito e frutos e uso que lhe Deus der na dita lezíria, assim de pão como sal ou a criação ou de qualquer outra coisa que dela se possa aproveitar como coisa sua e assim como pertence ao dito mosteiro e melhor se a eles melhor poderem sem de nada pagarem ao dito mosteiro coisa alguma senão os ditos trezentos e vinte reis, e eles, aforadores, não venderão nem trocarão nem em outra alguma maneira não alheara a dita lezíria nem parte dela, sem expressa licença e consentimento do dito mosteiro, sob pena de fazerem o contrário por esse mesmo feito perderem para o dito mosteiro todo o direito que nela tiveram, nem outrossim a partirão nem espedaçarão, mas antes para todo o sempre andará conjunta em uma pessoa e que por todas as coisas a este aforamento tocantes ele … e os que deles para todo o sempre descenderem sejam obrigados a responder perante o Ouvidor das terras do dito mosteiro, sem poderem declinar seu foro e juizo e começar a fazer a primeira paga da dita pensão pelo dia de S. Miguel de Setembro que vem, da era de quinhentos e vinte e um em diante em cada ano pelo dito dia, e disseram mais os sobreditos prior crasteiro, cónegos e convento e Vedor do dito mosteiro que querendo eles, os ditos aforadores, arrendar ou emprazar a dita lezíria por partes a lavradores pelo que bem lhes convier, o possam fazer sem mais autoridade e licença do dito mosteiro, pagando eles ditos António Fernandes e sua mulher e os que deles para todo o sempre descenderem, os ditos trezentos e vinte reis em cada um ano ao dito mosteiro, como dito é.

E o dito António Fernandes, que aqui presente estava, disse que ele por si e pela dita sua mulher, filhos e herdeiros nos recebera em si este aforamento da dita lezíria com todas as cláusulas e condições, penas e obrigações acima contidas, e se obrigava por si e seus bens móveis e de raiz … e jurava e de seus descendentes que para ele obrigou a tudo assim cumprirem e manterem e pagarem a dita pensão como dito é.


E os ditos prior crasteiro, cónegos e convento e Vedor do dito mosteiro obrigarão os bens e rendas deles a lhe fazerem este aforamento da dita lezíria para sempre, bom e de paz de quem quer que lho embargar quiser deles aforadores as condições deste contrato, o que tudo as ditas partes assim louvaram e outorgaram e prometeram cumprir e manter e em fé e testemunhas de verdade mandavam fazer uma nota da qual pediram seus instrumentos e os que lhe confirmam testemunhas que presentes foram, Fernando Anes, lavrador e morador em Antuzede e António Luís, criado do dito António Fernandes e outros”.

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