A Terra do Limonete
Tavarede,
a alegre terra do limonete oloroso:
Limonete
para o meu lenço
sempre
o meu amor me pe
Limonete,
rico incenso
das Várzeas de Tavarede.
Região
agrícola que alimenta o nosso Mercado, da mais fresca hortaliça e das mais
rescendentes frutas, apresentava o seu carro alegórico, uma síntese da vida
agrícola da região, com as modalidades – Hortas, Eiras e Vinha. A alegoria era
representada por uma meda de trigo, símbolo da abundância de pão; um homem com
um mangual, representando a actividade das Eiras; uma linda rapariga
representando a
Vinha; e, dominando o conjunto,
uma outra gentil moçoila simbolizando as Hortas. Um grupo de Ceifeiras e
Cavadores, como se voltassem, contentes e felizes, da faina do trabalho, vinham
à frente deste feliz conjunto alegórico e, dando a nota dos folguedos tão
peculiares do nosso povo, ainda nas horas que se seguem ao mais incessante
labor, dois harmónios tocavam as “modas” popularizadas na aldeia. (Jornal
Reclamo, em Julho de 1940, noticiando a participação tavaredense no cortejo
realizado na Figueira)
Dois
anos antes, em 1938, também se organizara na Figueira um cortejo de actividades
das freguesias. Como não podia deixar de ser, a nossa terra mandou uma
representação da sua principal, praticamente única, actividade: a agricultura.
“A freguesia de Tavarede foi uma das que mandou uma numerosa
e não menos luzida representação. A terra do limonete (Lúcia-Lima) como ela se
designa, abria a sua representação com um vaso desta planta. Seguiam-se uma
charrua e uma grade, tiradas por bois atrás das quais vinha um grupo de alegres
ceifeiras, de blusas e lenços de cores vivas, e saias traçadas, conduzindo
foices ao ombro e molhos de trigo nas mãos. Vinham em seguida os malhadores com
manguais, pás e forcados. Ao pescoço, traziam lenços vermelhos, para impedir
que a pragana penetrasse no corpo. Um lindo grupo de raparigas, com os chailes
traçados e conduzindo cestas à cabeça, animava a representação. Eram
vendedeiras de hortaliças, frutas e flores. Seguiam-se os cavadores de enxada
ao ombro, ramo de limonete nos chapéus, casaco ao ombro, polainas, cinta e
lenço vermelho, bolsa do farnel e cabaça cheia de vinho. O Grupo Musical e de
Instrução animava os festeiros”.
O terceiro caderno
de “TAVAREDE – A TERRA DE MEUS AVÓS”, vai servir para recordar, ainda que de
forma resumida, o que era a nossa pequena aldeia até quatro, cinco décadas
atrás, pois foi
a partir de então, que Tavarede deixou de ser
“aquela pequena aldeia pitoresca e aprazível”, muito visitada, especialmente no
verão, por aqueles que gostavam de apreciar a natureza e saborear, à fresca
sombra das árvores frondosas, apetitosos farnéis. “… metemos ao vale idílico de
Tavarede, com seu palácio condal, aldeia do limonete, aninhada entre o arvoredo
e quintas fartas. Lembra a
mancha clara do povoado, vista de longe, uma daquelas vilórias que nas páginas
de “Ilustre Casa de Ramires”, surgem, com seu nome bucólico, abençoado por
cândidas graças portuguesas…” (O Figueirense – Maio de 1928)
“Debruçam-se sobre
a terra rescendente de saúde, cheirosa a seiva, dálias aos montes. Cravos de Tavarede, pequenos mas olorosos,
atapetam canteiros onde rosas vivem a felicidade da sua beleza, fundindo o seu
perfume com o ar embalsamado pelo cheiro do limonete! Nem um palmo de terra sem
verdura!
Cantam ribeiros,
noite e dia, levando a água aos recortes das fazendas que vivem na fartura das
hortaliças tenras e pomares saborosos. Quando a gente ali vai, volta sempre com
esta certeza: não deve haver recanto de Portugal que seja mais florido, que
possua mais alegria de cor, quer seja quando a primavera começa começa a vestir
de verde-moço o tapete humedecido da terra amiga e acolhedora, quer seja quando
os últimos malmequeres fenecem, para os crisântemos nascerem e florirem, do que
o velho condado de Tavarede”. (Carlos Sombrio, em A
Voz da Justiça, Julho de 1927)
A partir de 1960 /
1970, as quintas e os pinhais, apelativos a uma boa merenda, saboreada em doce
calmaria, que então rodeavam a povoação, deram lugar a modernas urbanizações. O
progresso, digamos, chegou à velha terra do limonete, transformando-a e
tornando-a irreconhecível.
Mas, e como mencionei
no primeiro destes cadernos, este meu modesto trabalho, eu considero-o mais um
passatempo do que um trabalho, tinha e
tem por finalidade principal, deixar reunidos diversos apontamentos, que se
encontram dispersos pela imprensa figueirense, e não só, e por diversas
publicações, de forma a permitir o conhecimento, no futuro, do passado
histórico e cultural da minha terra natal, ainda que muito sintético e
resumido. Gostaria que um dia, os meus netos, e os netos de todos os meus
conterrâneos, pudessem, de forma fácil, saberem que a pequena aldeia de seus
avós, teve um papel bem importante na história do concelho da Figueira da Foz,
pois foi terra de gente importante, com foros de fidalguia.
No primeiro
caderno, procurei relatar o passado histórico da aldeia, a vida do seu povo e
alguns costumes, entretanto caídos no esquecimento. O segundo, dediquei-o às
duas grandes tradições culturais de Tavarede: o Teatro e a Música, bem como fiz
uma breve resenha das suas colectividades, tanto das actuais com das já
desaparecidas. E completei o caderno com a evocação de “aqueles que da morte se
libertaram honrando e dignificando Tavarede”.
Desnecessário se
torna dizer que, tanto no primeiro caderno como no segundo, muito mais haveria
a acrescentar. Aliás, e quanto mais vou relendo e revendo os meus inúmeros
apontamentos, mais vou reconhecendo as involuntárias omissões. Há factos e
figuras que merecem umas linhas evocativas, ainda que poucas. Há histórias que
será pena ficarem esquecidas na poeira dos anos passados…
Pois este meu
caderno vai ser, como referi, uma tentativa de recordar a minha aldeia dos
tempos em que “menino e moço” aqui me criei despreocupadamente e de alguma
maneira corrigir possíveis omissões, não todas, certamente, mas as que me
parecem mais interessantes.
Começarei por dar
conhecimento de como era a pequena aldeia. Já sabemos, pelo soneto de Frei
Manuel de Santa Clara, que, no século dezoito, Tavarede era um local aprazível
e idílico, a fazer fé na veia poética e sensível do frade franciscano. E no
século dezanove, na sua segunda metade, Tavarede foi muito falada na imprensa
figueirense, a propósito da discussão pública que então se travou àcerca do
traçado que se estava a escolher, para a estrada que haveria de ligar a
Figueira a Aveiro, passando por Mira.
É um fragmento
desta polémica que eu aqui transcrevo. Ernesto Fernandes Tomás, o mesmo que nos
deixou uma interessantíssima reportagem sobre a nossa terra, bastas vezes
referida nos anteriores cadernos, para apresentar a sua opinião, quanto ao
traçado daquela estrada, deixou-nos descrita a nossa terra, na sua localização
e caminhos, de uma forma muito interessante.
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